América Latina se une em apoio à decisão do Equador sobre Assange


Apoio ao fundador do Wikileaks é exemplo de uma política externa latino-americana coesa


Os países da América Latina se uniram para dar apoio ao governo equatoriano, que concedeu asilo político ao jornalista Julian Assange, criador do Wikileaks. Desde o fim da semana passada, quando o governo de Rafael Correa anunciou sua decisão de abrigar o perseguido político, blocos da região e autoridades nacionais defenderam Assange e repudiaram a ameaça do Reino Unido de invadir a embaixada equatoriana em Londres.

O Equador concedeu asilo político ao fundador do Wikileaks na última quinta-feira (16/08). Assange tenta impedir sua extradição à Suécia, onde é acusado de crimes sexuais. Seu maior temor é que, caso seja enviado a Estocolmo, ele possa ser extraditado aos Estados Unidos, onde pode responder pela revelação de documentos secretos do Departamento de Estado norte-americano, crime passível de condenação à pena de morte.

Neste domingo (19/08), a Unasul (a União de Nações Sul-americanas) declarou que considera a concessão de asilos políticos um “direito soberano” e sublinhou que respeitá-lo é manifestar “o fiel cumprimento de tratados internacionais”. Para o órgão, é somente ao reiterar “a vigência das instituições sobre asilo e refúgio” que as partes envolvidas no caso Assange conseguirão “proteger os Direitos Humanos daqueles que acreditam que suas vidas se encontram ameaçadas”.

Além dos chanceleres da Unasul, representantes da Alba (Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América) e a maioria dos que participam da OEA (Organização dos Estados Americanos) desafiaram as potências hegemônicas ao respaldar Assange, julgado pela divulgação de documentos secretos que expuseram os Estados Unidos.

Segundo Nicolás Maduro, ministro de Relações Exteriores da Venezuela, a América Latina está dizendo ao mundo que está “unida” e que é “independente” para defender seus princípios e ideias. Para ele, “as antigas potências coloniais têm que diminuir sua arrogância e prepotência”, conforme relatou o jornal espanhol Publico.es

O apoio ao jornalista, em um momento em que todas as grandes potências lhe negaram respaldo, garantiu visibilidade ao continente pela possibilidade da construção de uma política externa latino-americana, que defenda outros interesses que não os norte-americanos. 

Em seu primeiro pronunciamento público desde a concessão do asilo político, Assange reconheceu o respaldo destes países e os colocou ao lado daqueles que defendem a divulgação dos "crimes secretos dos poderosos", em oposição aos governos que oprimem. 

“Eu sou grato ao povo e aos governos de Argentina, Bolívia, Nicarágua, Brasil, Colômbia, El Salvador, Honduras, México, Peru, Venezuela, Colômbia e todos os demais países latino-americanos que defendem o direito de asilo”, disse ele neste domingo (19/08). 
Leia o discurso de Assange na íntegra:

Vocês podem me ouvir?

Eu estou aqui porque eu não posso estar aí com vocês hoje. Obrigado por ter vindo. Obrigado por sua determinação e sua generosidade de espírito.

Na noite de quarta-feira, após uma ameaça ter sido enviada a esta embaixada e a polícia ter invadido este edifício, vocês vieram no meio da noite para vigiar e trouxeram os olhos do mundo com vocês.

Dentro da embaixada, depois de escurecer, eu podia ouvir as equipes de policiais dentro do prédio, através da escada de incêndio interna. Mas eu sabia que haveria testemunhas. E isso é por causa de vocês.

Se o Reino Unido não jogou fora a Convenção de Viena na outra noite é porque o mundo estava assistindo. E o mundo estava assistindo porque vocês estavam vigiando.

A próxima vez que alguém lhe disser que é inútil defender esses direitos que nos são caros, lembrem-no de sua vigília no escuro diante da Embaixada do Equador.

E como, pela manhã, o sol apareceu em um mundo diferente, e uma corajosa nação da América Latina tomou uma posição pela justiça.

E, assim, a essas pessoas corajosas: eu agradeço ao presidente Correa pela coragem que mostrou ao me conceder asilo político.

E eu agradeço ao governo e ao ministro das Relações Exteriores Ricardo Patino, que confirmaram a constituição equatoriana e sua noção de direitos universais em sua consideração do meu caso.

E ao povo equatoriano por apoiar e defender esta Constituição.

E eu tenho uma dívida de gratidão para com os funcionários desta embaixada, cujas famílias vivem em Londres e que me mostraram hospitalidade e amabilidade, apesar das ameaças que receberam.

Nesta sexta-feira, haverá uma reunião de emergência dos ministros de Relações Exteriores da América Latina em Washington para resolver esta situação.

Eu sou grato ao povo e aos governos de Argentina, Bolívia, Nicarágua, Brasil, Chile, Colômbia, El Salvador, Honduras, México, Peru, Venezuela, Colômbia e todos o os demais países latino-americanos que defendem o direito de asilo.

Para as pessoas dos Estados Unidos, Reino Unido, Suécia e Austrália, que me apoiaram com força, mesmo quando seus governos não apoiaram. E para aquelas cabeças mais sábias no governo, que ainda estão lutando por justiça. O seu dia vai chegar.

Para a equipe, apoiadores e fontes do Wikileaks, cuja coragem e compromisso e lealdade não tem igual.

À minha família e aos meus filhos, aos quais seu pai foi negado. Perdoem-me. Vamos nos reunir em breve.

O Wikileaks está sob ameaça, assim como a liberdade de expressão e a saúde de nossas sociedades. Temos de articular esse movimento que é anterior ao governo dos Estados Unidos da América. Ele vai voltar e reafirmar os valores sobre os quais os EUA foram fundados? Ou será que vai oscilar para fora do precipício, arrastando-nos todos para um mundo perigoso e opressor, em que os jornalistas se calam sob o medo de ser processados ​​e os cidadãos devem sussurrar no escuro?

Eu digo que ele deve voltar.

Peço ao presidente Obama para fazer a coisa certa. Os Estados Unidos devem renunciar à sua caça às bruxas contra o Wikileaks.

Os Estados Unidos devem dissolver sua investigação do FBI. Os Estados Unidos devem prometer que não vão processar nossa equipe ou os nossos adeptos.

Os Estados Unidos devem jurar para o mundo que não vão perseguir os jornalistas por um foco de luz sobre os crimes secretos dos poderosos.

Não deve haver nenhuma conversa tola sobre processar quaisquer organizações de mídia, seja o Wikileaks ou o New York Times.

A guerra do governo dos EUA sobre denunciantes deve acabar.

Thomas Drake e William Binney e John Kirakou e os outros denunciantes heróicos dos EUA devem – devem – ser perdoados e terem recompensadas as dificuldades que têm suportado como defensores dos registros públicos.

E o soldado do Exército, que permanece em uma prisão militar em Fort Leavenworth, Kansas, que a ONU descobriu ter suportado meses de detenção torturante em Quantico, Virginia, e que ainda tem – depois de dois anos de prisão – de ser julgado, deve ser liberado.

E se Bradley Manning fez mesmo as coisas de que é acusado, ele é um herói, um exemplo para todos nós e um dos maiores prisioneiros políticos do mundo.

Bradley Manning deve ser liberado.

Na quarta-feira, Bradley Manning passou o 815º dia de detenção sem julgamento. O máximo legal é de 120 dias.

Na quinta-feira, meu amigo, Nabeel Rajab, foi condenado a três anos por um tuíte.

Na sexta-feira, uma banda russa foi condenado a dois anos de prisão por uma performance política.

Há unidade na opressão.

Deve haver unidade absoluta e determinação na resposta.

Postado no blog Terra Brasilis em 21/08/2012

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