Saques a supermercados e bóias togadas




Por Saul Leblon

Trabalhadores espanhóis liderados pela União de Esquerda fizeram dois saques a supermercados esta semana; um em Sevilha, outro em Cádiz, numa unidade do Carrefour. Carrinhos lotados foram distribuídos em periferias pobres. Foram atos simbólicos.Mas sua aderência à insatisfação social na zona do euro deixou a mídia e a direita de cabelos em pé. 


Esse o ponto a que chegamos pelas mãos do credo que no Brasil resiste em jogar a toalha: saques motivados por fome e incapacidade de poder de compra apresentam-se como plausíveis na quarta maior economia do euro. 


O alcance político desse Rubicão não deve ser subestimado. Sangrar direitos sociais para injetar hemoglobina em bancos tornou pertinente dispensar às gôndolas um tratamento expropriador semelhante. A Espanha tem 5, 7 milhões de desempregados. Doze milhões de espanhóis patinam na pobreza; na Andaluzia, 35% da força de trabalho das grandes cidades está fora do mercado. Mas o governo direitista continua a cortar gasto público para ostentar aos credores 'o maior arrocho em tempos de democracia'.


Programas sociais de renda básica, a exemplo do Bolsa Família (leia reportagem nesta pág.), constituem hoje uma reivindicação de esquerda na Espanha, Grécia, Portugal, Itália. Nos EUA, que já tem um cupom de alimentação herdado de Roosevelt, a direita republicana no Congresso não faz por menos. Quer aprovar um corte de US$ 16 bilhões nos tíquetes distribuídos a famílias pobres --o maior arrocho na história do programa desde os anos 90. O Bolsa Família brasileiro resistiu ao extermínio conservador desde os primórdios do Fome Zero, em 2003.


A exemplo de outras ações inclusivas, como as cotas étnicas e sociais para o ensino superior, aprovadas agora, foi maciçamente alvejado pela artilharia midiática. Felizmente para o Brasil, esse rally perdeu na economia e nas urnas, antes e durante a crise. Paradoxalmente, não fosse por isso, talvez o julgamento em curso no STF não significasse tanto para a direita brasileira, que se agarra às togas como náufragos de uma época histórica.


Postado no blog Carta Maior em 08/08/2012
Trecho grifado por mim

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