Brasil avança na guerra burra ao narcotráfico




Marco Antonio Araujo

“O mundo é redondo, mas está ficando cada dia mais chato”. A frase do Barão de Itararé teima em se manter insuportavelmente atual. Para deleite dos reacionários, o Brasil vem colaborando de forma decisiva para tornar nossa vida ainda mais miserável.

Nessa empreitada, o Congresso deve votar em fevereiro um projeto de lei que aumenta a pena mínima para quem for pego com drogas. Em resumo, querem abarrotar ainda mais nossas cadeias superlotadas com infelizes usuários e pequenos traficantes. Podem apostar na aprovação de mais essa medida estúpida e obscurantista. A ignorância e o terrorismo intelectual sempre vencem na hora da desgraça.

— Acho que vai ser um dos projetos mais fáceis de votar, e calculo que teremos 80% dos votos a favor — declarou Osmar Terra (PMDB-RS), autor do desvario populista.

É preciso ser ingênuo ou assumidamente perverso para acreditar que fechar o cerco sobre quem está na ponta do consumo vai surtir algum efeito benéfico no combate ao narcotráfico.

Os chefões dos cartéis devem estar muito felizes com esse reforço logístico que o legislador brasileiro está prestes a oferecer. Permanecerão intocáveis, apenas observando seu exército de zumbis servindo como bucha de canhão para um Estado incapaz de lidar com o segundo maior mercado mundial depois da indústria bélica. São bilhões de dólares circulando pelo planeta. Nenhum deles passou pelos que estão em Bangu ou Catanduvas.

Se algum governo quer efetivamente combater o tráfico de entorpecentes, basta fechar o cerco contra a lavagem de dinheiro (leia-se todos os grandes bancos e os paraísos fiscais). Ou legalizar de uma vez, o que dependeria de um esforço internacional inimaginável. Quer dizer, ninguém se atreve a por o dedo nessas feridas.

É nessa hora que prospera a retórica do medo, que é o que sobra para os incompetentes. Medidas nessa direção só atinge pobres e negros, e os EUA são um grande exemplo disso. Se aprovada mais essa inciativa que busca legislar com o senso comum e não com dados científicos, o poder público vai isolar ainda mais o Brasil do debate mundial. E manterá nas mãos de policiais um poder terrível, o de definir quem é usuário ou traficante. Medo.

Chegamos ao cúmulo de viver num País em que vender uma trouxa de maconha é mais grave que cometer homicídio. Desde 2006, quando foi criada a pena mínima para porte de drogas, o Brasil tinha 62 mil presos por tráfico. Hoje, são 134 mil. A proposta, que faz passar de cinco para oito anos o tempo mínimo de prisão (inafiançável), não vai alterar em nada o tráfico nem vai diminuir o consumo de drogas. Alguém duvida?

O que faz esse tipo de ideia sinistra vingar é o mais primitivo desejo de vingança e violência que a maioria da sociedade retroalimenta, sem perceber que encarcerar milhares de pés-de-chinelo só aumenta o valor agregado da droga. Quanto maior o risco envolvido em uma ação ilícita, maior sua rentabilidade. Essa, sim, é uma lei (do capitalismo) que funciona sempre. Até no Brasil pegou.

Postado no blog O Provocador em 08/01/2013


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