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Modelo internacional, Noah Alef, indígena e brasileiro



Noah Alef, 23 anos, é um modelo internacional brasileiro, de etnia pataxó, sendo um dos primeiros modelos indígenas do país. A par da carreira como modelo, Alef tem vindo a desenvolver um trabalho de sensibilização e ativismo em prol dos povos indígenas do Brasil. Wikipédia







Sombras e tramas



Tramam contra a democracia no Brasil para atingir os BRICs. O encontro do embaixador do Estado Genocida de Israel se encontra com o genocida Bolsonaro para tramar contra o governo Lula, a democracia e os BRICs. Fica cada vez mais claro o Jogo de Sombras em andamento. O Brasil está cercado de trevas e o futuro se mostra sombrio. O astrólogo Carlos Harmitt analisa o astral desse momento de infâmia da humanidade. Confira!

Jogos Pan-Americanos : Brasil termina em segundo lugar no quadro de medalhas



Os atletas brasileiras ficaram atrás dos EUA durante o torneio, que acontece no Chile

247 - O Brasil terminou em segundo lugar no quadro de medalhas, com 66 ouros, atrás dos 124 dos Estados Unidos, nos Jogos Pan-Americanos, em Santiago, capital do Chile. Os atletas brasileiros também conseguiram 73 pratas e 66 bronzes, alcançando um total de 205 medalhas.

O recorde anterior dos brasileiros foi no Pan de 2019, em Lima, capital peruana, onde o País conquistou 169 medalhas - 54 ouros, 45 pratas e 70 bronzes.

Ao Brasil, com amor



Jamil Chade, Juliana Monteiro | pandemia (Foto: Reprodução Reuters)


Apresentação do livro recém-lançado de Juliana Monteiro &
 Jamil Chade


Por Renato Janine Ribeiro

Amor é uma palavra onipresente em nossa sociedade. É um dos instrumentos mais poderosos do marketing atual. Amor vende quase qualquer produto. Mas por isso mesmo é importante saber o que ele quer dizer. Os estudiosos se dividem entre os que sustentam a existência de um “verdadeiro amor” e os que aceitam que haja vários tipos dele. A primeira distinção talvez seja entre um amor erótico, predatório no limite, e um amor dedicado, que no seu limite é doação, é o amor materno pelo filho. Não por acaso, nesta bela troca de cartas, tanto Juliana Monteiro quanto Jamil Chade falam da experiência que tiveram ao nascerem seus filhos.

Juliana tece uma oposição entre maternidade e guerra. Vingar, diz ela, para uma mãe, é ver seu rebento vingar, como dizemos de uma planta: é consolidar-se como ser vivo. (É muito diferente, praticamente o oposto, de vingar-se). Mães temem, por dias ou meses, talvez anos, que algo de ruim suceda a seu filho. Felizmente, acrescento eu, a mortalidade infantil despencou no último século, mercê especialmente da saúde pública, da água potável e do tratamento dos esgotos. A morte de crianças caiu, por milhar de nascimentos, de três dígitos para apenas um.

Pais não precisam mais ter inúmeros filhos para que sobrevivam um ou dois que, por sua vez, os amparem na velhice. Jamil fala do receio que teve, ao nascer seu filho Pol, de perdê-lo. Lembrei-me de Montaigne contando que teve “dois ou três” filhos que morreram em tenra infância. Comentando essa passagem, o historiador Philippe Ariès observa: qual pai, hoje em dia, não saberia se foram duas ou três as crianças que morreram na idade de 1 ou 2 anos? Haveria uma frieza maior naquela época ou simplesmente era tão comum a mortalidade infantil que já era aguardada a perda, e a memória se adaptava a ela?

Usualmente, quando falamos em amor, a tendência é distingui-lo da paixão. As definições clássicas de amor o identificam a querer o bem da pessoa amada – o que tem tudo a ver com o amor aos filhos, que antes mencionei. Mas o sentido usual de amor, na cultura atual, como a telenovela e a canção popular, está mais próximo do desejo sexual. Ora, este almeja o bem do amante mais que o da pessoa amada (ou desejada). Crimes passionais são justamente isso: se ela não vai ser minha, que morra.

Minha primeira orientadora, dona Gilda de Mello e Souza, se indignou quando Doca Street assassinou Ângela Diniz no final de 1976. E me disse algo assim: crime passional é uma farsa; para acreditar que um homem não possa viver sem a pessoa que ele diz amar, a lógica seria que ele se matasse. Matá-la e sobreviver mostra muito bem que esse suposto amor era mentira. Não era o querer bem ao outro, mas o desejo de dominá-lo.

Ora, somos inundados por uma mídia que apresenta o amor como sendo desejo, como sendo sexo. (Por isso mesmo tenho insistido em que, se é preciso termos educação sexual nas famílias e nas escolas – até para evitar a gravidez indesejada, o abuso sexual e a transmissão de doenças, inclusive fatais –, faz tanta ou mais falta educar para o amor).

***

Falar de amor num tempo de ódio é prioritário, como dizem de vários modos nossos dois autores. Vivemos, entre 1980 e 2010, trinta anos gloriosos – não como os após a Segunda Guerra Mundial, cuja glória esteve no desenvolvimento econômico dos países mais ricos e na formatação de um Estado do bem-estar social, mas como os do combate à fome e do avanço da democracia nos países mais pobres, entre eles o Brasil. Saímos, em 2013, do Mapa da Fome, ao qual lamentavelmente voltamos nos governos seguintes. Parecia vitoriosa a luta pela democracia. Poderíamos imaginar a grande regressão que depois veio? Poderíamos acreditar que pessoas queridas, até parentes nossos, viriam a apoiar governos que querem a morte de tantas pessoas, inclusive de seus consanguíneos ou amigos de infância?

Não por acaso, Juliana e Jamil insistem no papel democrático do amor e das paixões a ele correlatas, como a amizade. Lembro uma passagem de Jorge Luis Borges, quando evoca a homenagem de um guerreiro medieval ao inimigo morto. Lembro também uma observação atribuída a Margaret Mead, que data a humanidade (no sentido figurado e não como espécie, como qualidade ética) do osso humano que se recompôs de uma fratura: foi preciso haver quem cuidasse do ferido, quem o amparasse, até ele cicatrizar-se do machucado.

Noto que, nos últimos meses, me deparei várias vezes com essa referência ao comentário, genuíno ou não, da grande antropóloga. Quer dizer que cresce a esperança na ideia de que a humanidade, enquanto espécie humana, tenha a possibilidade de recuperar a humanidade enquanto sentimento de compaixão e prática de cooperação.

Ou lembremos a questão da ética do cuidado, levantada umas décadas atrás por Carol Gilligan. Ela parte de uma experiência proposta por seu mestre Kohlberg sobre o desenvolvimento moral da criança. Kohlberg colocava cada criança diante de um problema: a mãe dela estava à beira da morte, dependia de um remédio caríssimo para se curar, e o farmacêutico se recusava a dá-lo a ela. O que fazer então? Assim posta a questão, ela praticamente determina uma resposta ao modo de Antígona: a ética exige quebrar a lei. Dessa maneira respondiam os meninos, mas não as meninas, que insistiam em tentar persuadir o farmacêutico. Kohlberg disso inferiu uma deficiência das meninas na compreensão do problema – e do que ele chamou de ética da justiça –, mas Gilligan o contestou. O que elas expressariam seria uma ética do cuidado, um conjunto de valores em torno da convicção de que seria possível uma solução pelo acordo, não pelo confronto, não pelo corte (lembrando que decisão contém cisão, corte, no seu âmago). O modo masculino de ver as coisas seria incisivo, cortante; o feminino seria englobante, includente.

Ora, o avanço do papel das mulheres na sociedade atual não será sinal do que podemos chamar uma feminização crescente de nossa cultura? Notem que, ao contrário do que algumas autoras criticaram em Gilligan, nada disso supõe predicar uma essência masculina ou feminina, uma natureza belicosa do homem ou compassiva da mulher. Podemos seguir sua intuição entendendo-a como uma simples referência a papéis construídos ao longo dos milênios e que foram identificados a dois suportes diferentes, um o dos cromossomos XX e outro dos XY, mas podem estar presentes em homens e mulheres.

Se recuarmos no tempo, veremos que na sociedade medieval as mulheres, ou o feminino, desempenharam papel importante na adoção de costumes mais cuidadosos e respeitosos, processo que Norbert Elias chamou de “civilizar os costumes”. Foi a presença delas que levou, por exemplo, às maneiras modernas, como não cuspir na mesa (ou à mesa), não tomar a sopa diretamente da sopeira, não assoar o nariz sobre os pratos em que se servia o alimento. Esses cuidados, que hoje às vezes são associados, retroativamente, a intuitos higiênicos, na verdade se originaram de formas de respeito. Era respeitoso em relação ao outro, e em especial à mulher, abster-se de práticas que suscitassem o incômodo ou, mesmo, o asco.

A mulher era o outro por excelência. Pretendia-se agradá-la, conquistá-la: por isso, aqueles machões medievais, comparáveis a fazendeiros grosseiros de um Brasil que felizmente foi desaparecendo, a um Paulo Honório como o que Graciliano Ramos coloca em cena no seu São Bernardo, adotam modos que eles imaginam causar prazer às mulheres, e que seriam os delas. Por isso, faz sentido pensar aqui no amor materno: o amor que Juliana e Jamil dedicam ao Brasil é um amor de mãe.

É nosso país um filho? Todo país o é. Nenhum país é uma essência prévia a seus cidadãos. Toda pátria, ou mátria se assim preferirmos, é uma criação constante do afeto. Em português, chamamos de criança a pessoinha que estamos criando. Criar, em nossa língua, não é um ato fulgurante, instantâneo, como a criação divina do mundo a partir do nada, na versão judaico-cristã. É um trabalho longo, com muito afeto investido, que dura dez anos ou mais. Até pouco tempo atrás, por sinal, era uma tarefa da mãe, mais que do pai. E não é fortuito que o ódio que nestes últimos anos tomou conta de nosso país, e de tantos outros, nas mãos da extrema direita tenha tanto a ver com um retorno furioso do machismo.

Há homens que se sentem estranhos, perdidos num mundo em que perderam os privilégios que tinham por tão só haverem nascido num determinado sexo, classe, orientação sexual: e com o declínio da democracia desde a crise econômica iniciada em 2008, eles se consideraram autorizados a vingarem-se daqueles que se atreveram a se colocarem como seus iguais, pior que isso, a pensarem que podiam lhes ensinar algo novo e diferente.

Mas é esse o caminho do futuro, o dos diferentes, do “outro por excelência”, como foi a mulher por milhares de anos: e por isso Juliana e Jamil, querendo ambos devolver amor a um país que foi pilhado pelo ódio, escrevem ao Brasil (e sobre o Brasil) a partir da alteridade europeia, mas com um coração de quem se dirige a uma criança amada.






Professor titular aposentado do Departamento de Filosofia da USP. Autor, entre outros livros, de Maquiavel, a democracia e o Brasil (Estação Liberdade).




De que lado você ficará ?

 



De que lado você ficará ?

 



Os astros apontam um fevereiro dramático para o Brasil

 







Os astros apontam um fevereiro dramático para o Brasil

 







Alexandra Loras, ex-consulesa da França em São Paulo : o Brasil tem um apartheid naturalizado




A jornalista Alexandra Loras, que vive no Brasil há oito anos, disse à TV 247 que o Brasil, um dos países mais ricos do mundo, pratica uma escravidão moderna e extremamente violenta, mas travestida de democracia racial.
 Assista.


247 - O programa “Um Tom de resistência” desta semana recebeu a jornalista, apresentadora e ex-consulesa da França em São Paulo, Alexandra Loras, para debater a questão racial no país. Natural de Paris e morando no Brasil há oito anos, a francesa percebeu que o racismo no país é naturalizado e pauta as relações sociais entre brancos e negros. “A visão que temos do Brasil no exterior é através do campo criativo, do carnaval, da diversão através do futebol. Uma visão de um país bem miscigenado, bem diverso e democrático racialmente. No entanto, ao chegar aqui percebi que existe um apartheid, uma segregação muito maior do que na África do Sul e nos Estados Unidos na época da segregação. E esse apartheid é tão naturalizado e cordial, que as pessoas não conseguem perceber o quão ele é violento”, avaliou.

Alexandra criticou o mito da democracia racial no país, as consequências sistêmicas desta segregação e os seus reflexos no processo de desenvolvimento da população negra no Brasil. “Assistimos debaixo dos nossos olhos ao genocídio da juventude negra e uma escravidão moderna institucionalizada dentro de um dos países mais ricos do mundo, onde 56% da população é negra. Um país que integra o G20, que é a nona economia mundial e, que em termos de concentração de renda, só fica atrás do Catar, não pode continuar mantendo essa escassez estrutural de país de terceiro mundo, deixando boa parte da população vivendo na miséria”, analisou.

Formada em ciências políticas numa das mais prestigiadas instituições de ensino de Paris, Loras citou as “barreiras” e os obstáculos que precisou ultrapassar para se colocar como negra e mulher num ambiente branco e machista que é o da ciência política. “Eu, como mulher negra, já achava que não poderia fazer parte daquele ambiente. Quando fui fazer a entrevista para ingressar no curso, eu saí de lá chorando porque os entrevistadores, todos eles pessoas brancas, me atacaram verbalmente na intenção de me cutucar, fazer provocações insinuando que ali não era o meu lugar e que eu não tinha nada a ver com aquela instituição”

Autora e diretora do documentário “Inconscientes revelados”, em que apresenta um panorama atual da questão racial no Brasil, Loras explicou como o projeto foi concebido e como foi a escolha do elenco. “A ideia nasceu quando comecei a ser convidada para dar palestras em escolas públicas e instituições, como a Fundação Casa, que abriga menores infratores, onde tive a oportunidade de conversar com uma pluralidade de pessoas e entender melhor os motivos que as levaram a estarem naquela condição. A partir desta experiência enxerguei a necessidade de produzir um conteúdo e espalhar essa mensagem para mais pessoas, dando voz a intelectuais e acadêmicos negros que não são ouvidos e apresentando uma narrativa sobre a questão racial no Brasil abordando vários aspectos, como a eugenia, as cotas raciais e as micro agressões sofridas pelos negros através do racismo estrutural”.

Alexandra Loras, ex-consulesa da França em São Paulo : o Brasil tem um apartheid naturalizado




A jornalista Alexandra Loras, que vive no Brasil há oito anos, disse à TV 247 que o Brasil, um dos países mais ricos do mundo, pratica uma escravidão moderna e extremamente violenta, mas travestida de democracia racial.
 Assista.


247 - O programa “Um Tom de resistência” desta semana recebeu a jornalista, apresentadora e ex-consulesa da França em São Paulo, Alexandra Loras, para debater a questão racial no país. Natural de Paris e morando no Brasil há oito anos, a francesa percebeu que o racismo no país é naturalizado e pauta as relações sociais entre brancos e negros. “A visão que temos do Brasil no exterior é através do campo criativo, do carnaval, da diversão através do futebol. Uma visão de um país bem miscigenado, bem diverso e democrático racialmente. No entanto, ao chegar aqui percebi que existe um apartheid, uma segregação muito maior do que na África do Sul e nos Estados Unidos na época da segregação. E esse apartheid é tão naturalizado e cordial, que as pessoas não conseguem perceber o quão ele é violento”, avaliou.

Alexandra criticou o mito da democracia racial no país, as consequências sistêmicas desta segregação e os seus reflexos no processo de desenvolvimento da população negra no Brasil. “Assistimos debaixo dos nossos olhos ao genocídio da juventude negra e uma escravidão moderna institucionalizada dentro de um dos países mais ricos do mundo, onde 56% da população é negra. Um país que integra o G20, que é a nona economia mundial e, que em termos de concentração de renda, só fica atrás do Catar, não pode continuar mantendo essa escassez estrutural de país de terceiro mundo, deixando boa parte da população vivendo na miséria”, analisou.

As cinzas de um país




Fernando Brito

A consciência de um povo, como as matas de um país, estão sujeitas a incêndios, naturais ou provocados.

O tempo seco da crise iniciada em 2015, claro, criou-lhes as condições adequadas às chamas, mas elas não aconteceriam sem as ateassem gente instalada em lugares propícios e sem precaução contra a propagação além dos limites daquilo que queriam queimar.

Sim, porque pretendiam, a fogo, dar fim a esta praga da democracia, que tantos anos fazia que não conseguiam extirpar, mesmo com a mídia pulverizando ardentes acusações sobre ela.

O resultado é que perderam o controle do processo e as ditas instituições – que, pensaram, funcionariam como aceiros de uma queima controlada – não detiveram e até espalharam o incêndio, generalizando a destruição.

Tudo ardeu: a educação, a saúde, a moeda nacional, a economia mas, sobretudo, a compreensão de que não somos um paiseco, medíocre e estagnado, servil e sem remédio.

Como nos restos fumegantes do Pantanal, restou por toda a parte um chão calcinado, onde vagueiam políticos atrofiados, disformes, famintos e vorazes, que fazem ou se dispõem a fazer a predação dos cofres públicos, das riquezas da terra e os direitos da população.

Um terço dos viventes deste país viraram zumbis, adoradores fanáticos de um besta-fera que exala labaredas, que fedem a morte e a destruição.

De nada adianta dizer ou mostrar que estamos a caminho de virarmos um deserto, não só de matas e cerrados, mas de ideias e amores.

Aceita-se e aplaude-se, que “em nome de Deus” estejamos no que chamam de “caminho certo”, ainda que este seja aquele em que sobem os números do desemprego, da fome, do ódio grassando nas ruas, do fogo devorando o país.

Parece que a devastação chegou aos corações e mentes de parte significativa do povo brasileiro e que nossa dignidade carbonizou-se, que nossa capacidade de pensar consumiu-se, que nossos sentimentos de humanidade e solidariedade viraram cinzas frias.

Nosso calor, agora, não é o humano, mas o desumano.

A fumaça que encobre nossos horizontes há de passar, ainda que com muito sofrimento, para que possamos voltar a enxergar o sol. Mas como a flora e a fauna calcinadas, levaremos tempo, muito tempo, até nos recuperarmos da queimada que engoliu um Brasil que, não faz muito, vicejava e crescia.

Tal qual nos versos do Chico Buarque, chegará a hora em que rebrotaremos, “como se o céu vendo as penas/ Morresse de pena/E chovesse o perdão”.

Até lá, nossa bandeira não será vermelha, mas a terra, as matas e os horizontes seguirão rubros, como nossos rostos ficam, de vergonha com o que deixamos fazerem ao Brasil.




As cinzas de um país




Fernando Brito

A consciência de um povo, como as matas de um país, estão sujeitas a incêndios, naturais ou provocados.

O tempo seco da crise iniciada em 2015, claro, criou-lhes as condições adequadas às chamas, mas elas não aconteceriam sem as ateassem gente instalada em lugares propícios e sem precaução contra a propagação além dos limites daquilo que queriam queimar.

Sim, porque pretendiam, a fogo, dar fim a esta praga da democracia, que tantos anos fazia que não conseguiam extirpar, mesmo com a mídia pulverizando ardentes acusações sobre ela.

O resultado é que perderam o controle do processo e as ditas instituições – que, pensaram, funcionariam como aceiros de uma queima controlada – não detiveram e até espalharam o incêndio, generalizando a destruição.

Tudo ardeu: a educação, a saúde, a moeda nacional, a economia mas, sobretudo, a compreensão de que não somos um paiseco, medíocre e estagnado, servil e sem remédio.

Como nos restos fumegantes do Pantanal, restou por toda a parte um chão calcinado, onde vagueiam políticos atrofiados, disformes, famintos e vorazes, que fazem ou se dispõem a fazer a predação dos cofres públicos, das riquezas da terra e os direitos da população.

Um terço dos viventes deste país viraram zumbis, adoradores fanáticos de um besta-fera que exala labaredas, que fedem a morte e a destruição.

De nada adianta dizer ou mostrar que estamos a caminho de virarmos um deserto, não só de matas e cerrados, mas de ideias e amores.

Aceita-se e aplaude-se, que “em nome de Deus” estejamos no que chamam de “caminho certo”, ainda que este seja aquele em que sobem os números do desemprego, da fome, do ódio grassando nas ruas, do fogo devorando o país.

Parece que a devastação chegou aos corações e mentes de parte significativa do povo brasileiro e que nossa dignidade carbonizou-se, que nossa capacidade de pensar consumiu-se, que nossos sentimentos de humanidade e solidariedade viraram cinzas frias.

Nosso calor, agora, não é o humano, mas o desumano.

A fumaça que encobre nossos horizontes há de passar, ainda que com muito sofrimento, para que possamos voltar a enxergar o sol. Mas como a flora e a fauna calcinadas, levaremos tempo, muito tempo, até nos recuperarmos da queimada que engoliu um Brasil que, não faz muito, vicejava e crescia.

Tal qual nos versos do Chico Buarque, chegará a hora em que rebrotaremos, “como se o céu vendo as penas/ Morresse de pena/E chovesse o perdão”.

Até lá, nossa bandeira não será vermelha, mas a terra, as matas e os horizontes seguirão rubros, como nossos rostos ficam, de vergonha com o que deixamos fazerem ao Brasil.




Imperdível nesta manhã de sábado a reportagem do The New York Times sobre o drama dos efeitos do novo coronavírus na Amazônia


E daí ?


Fernando Brito


Leitura – e visão – imperdível nesta manhã de sábado a reportagem do The New York Times sobre o drama dos efeitos do novo coronavírus na Amazônia, com fotografias impressionantes de Tyler Hicks, vencedor do Prêmio Pulitzer de Fotografia de 2014 e com vasta experiência em coberturas de guerras e dramas himanos. Curiosamente, Tyler nas ceu em São Paulo, embora tenha se formado em Boston e viva hoje no Quênia. Os textos são de Julie Turkevitz e da repórter brasileira Manuela Andreoni, com gráficos animados de Jeremy White.



O desespero de famílias como a de Gertrude do Santos – a da foto – é descrito com crua delicadeza na publicação, que está aberta ao acesso público:



Gertrude Ferreira Dos Santos morava no extremo leste da cidade [de Manaus], em um bairro pressionado contra a água. Ela costumava dizer que sua coisa favorita no mundo era viajar de barco pelo rio. Com a brisa no rosto, ela se sentia livre.
Então, em maio, a senhora dos Santos, 54 anos, adoeceu. Dias depois, ela chamou seus filhos para a cama, fazendo-os prometerem ficar juntos. Ela parecia saber que estava prestes a morrer.
As equipes funerárias trabalhavam dia e noite para coletar corpos, incluindo o da Sra. Dos Santos. Muitas pessoas com sintomas do vírus preferem ficar em casa, com medo do hospital e morrendo sozinhas.
Houve tantas mortes em Manaus que a cidade cortou novos cemitérios da floresta densa.
Eduany, 22 anos, sua filha mais nova, ficou com ela naquela noite. No início da manhã, quando Eduany se levantou para fazer uma pausa, sua irmã Elen, 28 anos, implorou para que ela voltasse. A mãe deles parou de respirar. As irmãs, desesperadas, tentaram ressuscitar boca a boca. Às 6 horas da manhã, com o sol nascendo sobre a cidade, a Sra. Dos Santos morreu em seus braços.
Quando homens de traje de proteção branco chegaram mais tarde para levar seu corpo, as irmãs começaram a lamentar.
Dos Santos era mãe solteira. A vida nem sempre foi fácil. Mas ela tinha mantido um sentimento de encantamento, algo que suas filhas admiravam. “Em tudo o que ela fez”, disse Elen, “ela estava alegre.”
O atestado de óbito de sua mãe listou muitas condições subjacentes, incluindo problemas respiratórios de longa data, de acordo com as mulheres. Ele também listou insuficiência respiratória, indicador importante de que uma pessoa morreu devido ao coronavírus.
Mas suas filhas não acreditavam que ela era vítima da pandemia. Certamente ela havia morrido de outras causas, disseram eles. Deus não teria dado a ela uma doença tão feia.

Gertrude é uma das mais de 85 mil pessoas que se foram para esta doença tão feia e sua família mereceu de um jornal norte-americano a atenção à sua dor.

Do presidente de seu país, apenas um “e daí? Vai morrer gente, mesmo”.

Querendo ler, diretamente, no The New York Times, clique no título abaixo :





Fotografias por Tyler Hicks

Escrito por Julie Turkewitz e Manuela Andreoni

Gráficos por Jeremy White

25 de julho de 2020


O VÍRUS VARREU A REGIÃO como pragas passadas que viajaram o rio com colonizadores e corporações.

Espalhou-se com as canoas de escavação que transportavam famílias de cidade em cidade, os botes de pesca com motores de chocalho, as balsas movendo mercadorias por centenas de quilômetros, cheias de passageiros dormindo em redes, lado a lado, por dias de cada vez.

O Rio Amazonas é a fonte de vida essencial da América do Sul, uma super rodovia brilhante que corta o continente. É a artéria central de uma vasta rede de afluentes que sustenta cerca de 30 milhões de pessoas em oito países, movendo suprimentos, pessoas e indústria profundamente em regiões florestadas muitas vezes intocadas por estradas.


Mas, mais uma vez, em um eco doloroso da história, também está trazendo doenças.

Redes tornaram-se macas, levando os doentes de comunidades sem médicos

Uma família de luto por sua matriarca, Gertrude Ferreira dos Santos, que passou a vida ao longo do rio

Ambulâncias de barco viajam por horas para alcançar um único paciente

À medida que a pandemia ataca o Brasil, sobrecarregando-o com mais de dois milhões de infecções e mais de 84.000 mortes — perdendo apenas para os Estados Unidos —, o vírus está tomando um pedágio excepcionalmente alto sobre a região amazônica e as pessoas que dependem de sua abundância há gerações.

No Brasil, as seis cidades com maior exposição ao coronavírus estão todas no Rio Amazonas, de acordo com um novo estudo expansivo de pesquisadores brasileiros que mediu anticorpos na população.

A epidemia se espalhou tão rapidamente e completamente ao longo do rio que, em comunidades remotas de pesca e agricultura como Tefé, as pessoas têm sido tão propensas a obter o vírus como em Nova York, lar de um dos piores surtos do mundo.

"Foi tudo muito rápido", disse Isabel Delgado, 34, cujo pai, Felicindo, morreu do vírus pouco depois de adoecer na pequena cidade de Coari. Ele nasceu no rio, criou sua família por ele e construiu sua vida elaborando móveis a partir da madeira em suas margens.

Nos últimos quatro meses, à medida que a epidemia viajava da maior cidade da Amazônia brasileira, Manaus, com seus arranha-céus e fábricas, para pequenas e aparentemente isoladas aldeias no interior, o frágil sistema de saúde tem cedido sob o ataque.

Cidades e cidades ao longo do rio têm algumas das maiores mortes per capita do país — muitas vezes várias vezes a média nacional. Em Manaus, havia períodos em que cada ala covid estava cheia e 100 pessoas morriam por dia, empurrando a cidade para cortar novos cemitérios de mata grossa. Coveiros colocavam fileiras de caixões em longas trincheiras esculpidas na terra recém-transformada.

Descendo o rio, as redes se tornaram macas, levando os doentes de comunidades sem médicos para ambulâncias de barco que se acariciam através da água. Em áreas remotas da bacia hidrográfica, aviões medevac pousam em pequenas pistas de pouso cortadas na paisagem exuberante apenas para descobrir que seus pacientes morreram enquanto esperavam por ajuda.

O vírus está exigindo um pedágio especialmente alto sobre os povos indígenas, um paralelo com o passado. Desde 1500, ondas de exploradores percorreram o rio, buscando ouro, terra e convertidos — e mais tarde, a borracha, um recurso que ajudou a alimentar a Revolução Industrial, mudando o mundo. Mas com eles, esses forasteiros trouxeram violência e doenças como varíola e sarampo, matando milhões e exterminando comunidades inteiras.

"Este é um lugar que gerou tanta riqueza para os outros", disse Charles C. Mann, um jornalista que escreveu extensivamente sobre a história das Américas, "e veja o que está acontecendo com ele".

Os indígenas têm cerca de seis vezes mais chances de serem infectados pelo coronavírus do que os brancos, segundo o estudo brasileiro, e estão morrendo em aldeias distantes do rio intocadas pela eletricidade.

MESMO NOS MELHORES TEMPOS, a Amazônia estava entre as partes mais negligenciadas do país, um lugar onde a mão amiga do governo pode se sentir distante, mesmo inexistente.

Mas a capacidade da região de enfrentar o vírus tem sido ainda mais enfraquecida sob o presidente Jair Bolsonaro, cujas demissões públicas da epidemia têm sido, por vezes, em escárnio, embora ele tenha testado positivo.

O vírus surgiu no relógio desorganizado e sem brilho de seu governo, rasgando a nação. Desde seus primeiros dias no cargo, Bolsonaro deixou claro que proteger o bem-estar das comunidades indígenas não era sua prioridade, cortar seus financiamentos, reduzir suas proteções e incentivar invasões ilegais em seu território.

Para o forasteiro, a região densamente florestada ao longo do rio Amazonas parece impenetrável, desconectada do resto do mundo.

Mas esse isolamento é enganoso, disse Tatiana Schor, professora brasileira de geografia que vive de um dos afluentes do rio.

"Não existem comunidades isoladas na Amazônia", disse ela, "e o vírus mostrou isso".

Os barcos nos quais quase todos dependem , às vezes lotados com mais de 100 passageiros por muitos dias, estão por trás da propagação do vírus, dizem os pesquisadores. E mesmo que os governos locais tenham oficialmente limitado as viagens, as pessoas continuaram a levar para a água porque quase tudo - comida, remédios, até mesmo a viagem para a capital para pegar ajuda emergencial - depende do rio.

Pessoas doentes viajaram no rio para serem testadas para o vírus

Estudiosos há muito se referem à vida na Amazônia como uma "maneira anfíbia de ser".

A crise na Amazônia brasileira começou em Manaus, cidade de 2,2 milhões que saiu da floresta em uma erupção de concreto e vidro, afunilando em suas bordas a aglomerados de casas de madeira empoleiradas em palafitas, no alto da água.

Manaus, capital do Estado do Amazonas, é hoje uma potência industrial, um grande produtor de motocicletas, com muitos negócios estrangeiros. Está intimamente ligado ao resto do mundo — seu aeroporto internacional tem cerca de 250.000 passageiros por mês — e, através do rio, para grande parte da região amazônica.

O primeiro caso documentado de Manaus, confirmado em 13 de março, veio da Inglaterra. O paciente apresentava sintomas leves e estava em quarentena em casa, em uma parte mais rica da cidade, de acordo com as autoridades de saúde da cidade.

Logo, porém, o vírus parecia estar em toda parte.

"Não tínhamos mais leitos — nem mesmo poltronas", disse o Dr. Álvaro Queiroz, 26 anos, sobre os dias em que seu hospital público em Manaus estava completamente lotado. "As pessoas nunca pararam de vir."

Gertrude Ferreira Dos Santos morava na orla leste da cidade, em um bairro pressionado contra a água. Ela costumava dizer que sua coisa favorita no mundo era viajar o rio de barco. Com a brisa em seu rosto, ela disse, ela se sentiu livre.

Então, em maio, a Sra. dos Santos, 54 anos, adoeceu. Dias depois, ela chamou seus filhos para sua cama, fazendo-os prometer ficar juntos. Ela parecia saber que estava prestes a morrer.

Equipes funerárias trabalharam 24 horas por dia para recolher corpos, incluindo o da Sra. dos Santos

Muitas pessoas com sintomas do vírus preferem ficar em casa, com medo do hospital e de morrer sozinha

Houve tantas mortes em Manaus que a cidade cortou novos cemitérios de mata grossa

Eduany, 22 anos, sua filha mais nova, ficou com ela naquela noite. No início da manhã, quando Eduany se levantou para fazer uma pausa, sua irmã Elen, 28, implorou para ela voltar.

A mãe deles parou de respirar. As irmãs, em desespero, tentaram ressuscitação boca-a-boca. Às 6 da manhã, o sol nascendo sobre a cidade, a Sra. dos Santos morreu em seus braços.

Quando homens de terno branco de proteção chegaram mais tarde para levar seu corpo, as irmãs começaram a chorar.

A Sra. dos Santos tinha sido mãe solteira. A vida nem sempre foi fácil. Mas ela tinha mantido um senso de admiração, algo que suas filhas admiravam. "Em tudo o que ela fez", disse Elen, "ela estava alegre."

A certidão de óbito de sua mãe listou muitas condições subjacentes, incluindo problemas respiratórios de longa data, de acordo com as mulheres. Também listou insuficiência respiratória, um indicador chave de que uma pessoa morreu do coronavírus.

Mas suas filhas não acreditavam que ela era vítima da pandemia. Ela certamente tinha morrido de outras causas, disseram eles. Deus não teria lhe dado uma doença tão feia.

Ao longo do rio, as pessoas diziam coisas semelhantes uma e outra vez, relutantes em admitir um possível contágio, mesmo quando a saúde de seus irmãos e pais declinou. Muitos pareciam pensar que suas famílias seriam evitadas, que um diagnóstico de alguma forma mancharia uma vida digna.

Mas como esse estigma levou as pessoas a jogar para baixo sintomas do vírus por medo, os médicos disseram, a pandemia estava se espalhando rapidamente.

Depois de Manaus, o vírus viajou para leste e oeste, correndo para longe do centro de saúde da região.

Equipes médicas viajando para testar pessoas

Um centro comunitário foi transformado em uma clínica de ambulatório

Em lugares distantes da capital, suprimentos básicos, incluindo desinfetante, são enviados para dentro


EM MANACAPURU, a mais de uma hora da capital, Messias Nascimento Farias, 40 anos, levou a esposa doente até o carro e acelerou uma das poucas estradas rurais da região para encontrar a ambulância que poderia levá-la a um hospital.

Sua esposa, Sandra Machado Dutra, 36 anos, engasgou em seu caminhão.

"O Senhor é meu pastor, eu não quero", ele orou mais e mais até que ele a entregou aos profissionais de saúde. Eles tiveram sorte. Ela sobreviveu.

Mas para a maioria das pessoas que vivem ao longo do rio, a centenas de quilômetros de barco de Manaus, o caminho mais rápido para um grande hospital é de avião.

Mesmo antes do vírus chegar, pessoas em comunidades distantes com uma emergência com risco de vida poderiam fazer uma chamada frenética para uma ambulância de avião que os levaria a um hospital na capital.

Mas os aviões pequenos acabaram por ser perigosos para as pessoas com Covid-19, às vezes fazendo com que os níveis de oxigênio no sangue despenquem à medida que a aeronave subia. Muito poucos dos pacientes do transporte aéreo pareciam estar sobrevivendo, disseram os médicos.

Em vez disso, médicos e enfermeiros se viram levando seus pacientes para mortes dolorosas longe de tudo e de todos que amavam.

Numa manhã de maio, um avião branco pousou no aeroporto de Coari, a cerca de 300 km de Manaus.

Sandra Machado Dutra desmaiou antes de ser levantada em uma ambulância

A família de Felicindo Delgado, o fabricante de móveis, acenou adeus quando ele foi carregado em um avião em Coari

O voo afetou o Sr. Delgado


Na pista em uma maca estava o Sr. Delgado, 68 anos, o fabricante de móveis, descalço e mal respirando.

Dr. Daniel Sérgio Siqueira e uma enfermeira, Walci Frank, exaustos após semanas de trabalho constante, o carregaram para a pequena cabine. À medida que o avião subia, seus níveis de oxigênio começaram a cair.

A filha do Sr. Delgado, Isabel, recorreu ao médico em pânico. "Meu pai é muito forte", ela disse a ele. "Ele vai conseguir."

Quando os Delgados finalmente chegaram ao hospital em Manaus, Isabel ficou chocada com as cenas ao seu redor. Parentes desesperados ergueram entes queridos que haviam amassado sob o fardo da doença, apressando-os para o tratamento.

Ao mesmo tempo, os pacientes que tinham conseguido sobreviver a Covid-19 cambalearam para fora, para os braços alegres da família e amigos.

"Eu estava lá", disse ela, "rezando para que Deus salvasse meu pai."

Delgado morreu alguns dias depois. Quando Isabel descobriu, o médico começou a chorar com ela.

Ela não tinha dúvidas de que o rio que seu pai amava também lhe trouxe o vírus. Logo, ela e outros cinco membros da família também adoeceram.

Uma família em Manacapuru se reuniu para ouvir a avaliação de um médico

Um médico tratando uma paciente frágil em sua casa em Manacapuru

Algumas pessoas que ficaram doentes esperaram até ficarem muito fracas para ir ao hospital


QUANDO O CORONAVÍRUS CHEGOU ÀS AMÉRICAS, havia um medo generalizado de que isso levaria a um impacto devastador sobre as comunidades indígenas em toda a região.

Em muitos lugares ao longo do rio Amazonas, esses medos parecem estar se tornando realidade.

Pelo menos 570 indígenas no Brasil morreram da doença desde março, segundo uma associação que representa os indígenas do país. A grande maioria dessas mortes foram em lugares ligados ao rio.

Mais de 18.000 indígenas foram infectados. Líderes comunitários relataram aldeias inteiras confinadas às suas redes, lutando para se levantar até mesmo para alimentar seus filhos.

Em muitos casos, os próprios profissionais de saúde enviados para ajudá-los espalharam inadvertidamente o vírus.

No povoado ribeirinho de São José da Fortaleza, os parentes do chefe Iakonero Apurinã mandaram, um a um, que não podiam comer, que ouviam vozes,que estavam muito doentes para se levantar.

Logo, pareceu ao chefe que todos em sua comunidade estavam doentes.

As famílias de Apurinã sobreviveram a gerações de violência e trabalho forçado. O vírus os testou de novo.

O vírus atingiu durante a estação chuvosa, inchando as vias navegáveis

As balsas continuaram a cercar a região, com pessoas dormindo lado a lado por dias de cada vez


O chefe Apurinã, 54, disse que seu grupo de 35 famílias Apurinã sobreviveu a gerações de violência e trabalho forçado. Eles haviam chegado a São José da Fortaleza décadas atrás, acreditando que finalmente estariam seguros.

Foi o rio, disse o chefe, que os sustentou, alimentando, lavando e limpando espiritualmente.


Então a nova doença chegou, e o chefe estava transportando chás tradicionais de casa em casa. Logo veio sua própria tosse e exaustão. Um teste em Coari confirmou que ela havia pegado o vírus.

O Chefe Apurinã não culpou o rio. Ela culpou as pessoas que viajaram.

"O rio para nós é a purificação", disse ela. "É a coisa mais linda que existe."

Milagrosamente, ela disse que em meados de julho, nenhuma pessoa entre as 35 famílias havia morrido.

Em Tefé, cidade de 60 mil pessoas a quase 600 quilômetros ao longo do rio de Manaus, o vírus chegou com força de vendaval.

No pequeno hospital público, onde os funcionários inicialmente planejavam acomodar 12 pacientes, cerca de 50 lotaram a unidade improvisada Covid-19. Laura Crivellari, 31 anos, a única especialista em doenças infecciosas do hospital, os acolheu, fazendo o que pôde com dois respiradores, sem unidade de terapia intensiva, muitos colegas doentes — e ninguém para substituí-los.

Em um dos piores momentos, ela foi a única médica de plantão por dois dias, supervisionando dezenas de pacientes em estado crítico.

Os pacientes rapidamente sobrecarregaram a ala Covid-19 do hospital em Tefé

A morte constante em Tefé levou um médico ao ponto de ruptura

Aguardando sepultamento em Tefé

A morte constante levou o Dr. Crivellari ao seu ponto de ruptura. Alguns dias ela mal parava para comer ou beber.

Em casa, ela compartilhou sua angústia com seu parceiro. Ela estava pensando em desistir da medicina, ela disse. "Não posso continuar assim", ela disse a ele.

A pandemia tem sido brutal para os trabalhadores médicos em todo o mundo, e tem sido particularmente difícil para os médicos e enfermeiros que navegam pelas grandes distâncias, cortes frequentes de comunicação e escassez profunda de suprimentos ao longo da Amazônia.

Sem treinamento ou equipamento adequado, muitas enfermeiras e médicos ao longo do rio morreram. Outros infectaram suas famílias.

Crivellari sabia que sua cidade era vulnerável. São três dias de barco de Manaus a Tefé, com balsas muitas vezes transportando 150 pessoas por vez.

"Nosso medo era que uma pessoa infectada contaminasse todo o barco", disse ela, "e foi isso que acabou acontecendo."

No início de julho, as mortes diárias em Tefé estavam caindo, e o Dr. Crivellari começou a celebrar os pacientes que ela tinha conseguido salvar. Ela não pensa mais em largar a medicina.

Tefé, como um todo, teve um fôlego coletivo cauteloso.

O vírus, pelo menos por enquanto, tinha se mudado para um novo lugar no rio.

Cuidando do corpo de Gauldino da Silva. Com tantos morrendo em casa, não testados, o verdadeiro pedágio do vírus na região pode nunca ser conhecido






Fontes: Dados de casos do Ministério da Saúde do Brasil. Taxas de mortalidade por Brasil.io.