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O mundo alcoolizado




Sobre o álcool como droga do mundo moderno e a naturalidade 
de seu consumo excessivo

Gustl Rosenkranz

Foi no final da década de 60 e no início da década de 70 que a Organização Mundial da Saúde iniciou estudos para provar que o cigarro faz mal à saúde, mas isso não foi fácil, pois, como tanto políticos como médicos fumavam, eles boicotavam os estudos, relativizando os perigos do fumo. Somente décadas depois isso foi possível, quando os fatos não podiam mais ser contestados.

Hoje vivemos a mesma coisa em relação ao consumo excessivo de álcool, já que a maioria bebe, também políticos e médicos, e vemos uma contradição absurda: o cigarro é combatido com fervor (com razão, pois prejudica a saúde!), enquanto aceitamos ver as pessoas se destruindo aos poucos com bebidas alcoólicas. Proibimos propaganda de cigarros, mas vemos constantemente propagandas de bebidas, não raramente direcionada ao público jovem. 

Escrevo sem qualquer moralismo. Acho que na vida não devemos demonizar nada e não me refiro a uma cervejinha ou um vinho de vez em quando.

Refiro-me à naturalidade com que bebemos quase que diariamente, qualquer evento social tem hoje que ser “regado” com bebidas, muitas vezes bem fortes, as pessoas parecem que desaprenderam a se divertir sem se anestesiar com “água de fogo” e qualquer ocasião parece ser uma boa desculpa para beber e não raramente “encher a cara”.

Preocupa-me a naturalidade do exagero, a bebida cotidiana, no almoço, no jantar, em qualquer balada de fim de semana.

Conheço gente que não dança antes de tomar alguma coisa “para relaxar e criar coragem”, conheço gente que só se abre depois de beber, vejo gente que fica bêbada regularmente, consumindo álcool até cair pelos cantos, como se isso fosse a coisa mais natural do mundo… E é isso que preocupa.

O fenômeno do consumo excessivo de álcool não afeta somente o Brasil ou a Alemanha, não é um fenômeno local, mas sim global, sendo inibido com algum sucesso somente em sociedades de extremo controle religioso. 

Mesmo em países onde se tenta uma inibição por lei, como nos países da Escandinávia, por exemplo, se bebe do mesmo jeito, escondido, contrabandeando, mas se bebe. 

Álcool é a droga do mundo moderno. E esse consumo excessivo tem seus efeitos, ainda negados pela sociedade, já que o vício coletivo, como qualquer outro vício, não quer de forma alguma ser inibido. E esses efeitos não são nada inofensivos, mesmo que muitas vezes só se manifestem anos depois. Aqui apenas um resumo dos principais:

Danos à saúde: O consumo de bebidas alcoólicas afeta praticamente todos os órgãos do organismo e está relacionado a mais de 60 doenças, cirrose hepática e pancreatite crônica são apenas algumas delas, sem falar dos riscos psicossociais, derrame, por ser um depressor do sistema nervoso central, alterações no sono, câncer no trato intestinal, bexiga, próstata e doenças cardiovasculares como a hipertensão e aterosclerose.

Por gerar alterações fisiológicas no trato gastrointestinal, o consumo de álcool prejudica a absorção de nutrientes como as vitaminas do complexo B, vitamina D, além de interferir no metabolismo e aumentar a excreção de vitamina C, magnésio, zinco, selênio, podendo causar danos cerebrais graves. Pessoas que bebem regularmente tendem perder a vontade de praticar atividades físicas, o que só aumenta os riscos para a saúde. 

Também a estética sofre, o consumo de álcool afeta a pele devido a um estresse oxidativo que provoca a degradação do colágeno (responsável pela elasticidade da pele) e acúmulo de elastina (presentes na pele envelhecida). Álcool engorda, pois, à medida que envelhecemos, nosso metabolismo fica mais lento e o consumo a longo prazo do álcool compreende calorias em excesso que são convertidas em gordura, acumulando-se principalmente na região abdominal, o que pode aumentar também a incidência para doenças cardiovasculares. 

Também interfere na absorção do cálcio deixando os ossos mais frágeis, o que pode acarretar em fraturas ou mesmo na osteoporose. Associado ao cigarro, os danos do álcool aumentam ainda mais. 

Distúrbios emocionais e problemas sociais: O consumo de álcool ocasiona a perda da inibição, sendo que pessoa intoxicada com álcool pode fazer coisas que normalmente não faria, como, por exemplo, dirigir um carro em alta velocidade ou provocar pessoas na rua. 

A pessoa pode ter seu humor afetado, ocasionando raiva, comportamento violento, tristeza, depressão e até mesmo suicídio. 

O risco de perda de memória pode ter consequências sérias, já que não saber mais o que fez em público pode ser traumatizante. A vida familiar do alcoolista sofre, ocasionando desentendimentos. 

A longo prazo, os filhos podem sofrer de problemas emocionais e relações íntimas e importantes podem ser totalmente destruídas. 

O consumo de álcool diminui a produtividade no trabalho, a assiduidade, podendo levar ao desemprego. A perda de controle sobre os próprios atos pode gerar conflitos sociais sérios, chegando até mesmo isolar a pessoa, o que, por sua vez, pode aumentar o consumo de álcool, formando um círculo vicioso, difícil de ser quebrado. 

Aumento de perigo de acidentes: O consumo abusivo de álcool está diretamente ligado ao aumento de risco de acidentes de trânsito, quedas, queimaduras, ferimentos em atividades esportivas e recreativas e resultantes de violência interpessoal.

Não é uma coisa triste ver gente babando, vomitando, urinando em qualquer lugar, deitada por aí, procurando briga, falando besteira, se expondo ao ridículo, dirigindo, causando acidentes, ferindo, matando, maltratando os filhos, etc., etc., em nome do álcool, usando-o como desculpa, sem se envergonhar desse papel? 

De forma alguma, estou supondo que quem consome álcool é automaticamente um alcoólatra e se verá necessariamente confrontado com os problemas acima citados.

Mas o perigo existe, a depender da frequência com que se bebe, da predisposição pessoal ao vício, da qualidade e do tipo de bebida ingerida e do estilo de vida em geral. 

Álcool é uma droga que, como qualquer outra, pode causar dependência. E essa dependência pode ir se desenvolvendo aos poucos, sem que se perceba. Como se trata de uma droga aceita socialmente, pode ser que um alcoólatra e as pessoas à sua volta só percebam o problema já tarde demais, quando a saúde já foi afetada de forma irreversível e uma libertação do vício só seja possível através de internamento e ajuda de profissionais. 

Repito que não há moralismo no que escrevo. Não julgo ninguém e acho que não há nada demais em tomar uma bebida alcoólica de vez em quando, mas deixo meu apelo à inteligência de cada um: não exagere, fique atento e reaja quando perceber que está perdendo o controle e que a bebida já faz parte “inseparável” de sua vida, de seu dia-a-dia. 

Quer beber, beba, mas beba com moderação, ciente dos riscos e, se você acredita que estou exagerando e que beber não é nada demais, lembre-se que o cigarro também era socialmente aceito como algo inofensivo até relativamente pouco tempo atrás. Ignorar um perigo, seja ele qual for, é a melhor forma de um dia ser vítima dele.