A Pátria-mãe que chora e a esperança que nunca vai se esborrachar



equilibrista


Fernando Brito


O Bêbado e a Equilibrista, dos geniais Aldir Blanc e João Bosco, virou uma espécie de “hino da anistia”, no final da noite escura da ditadura implantada em 1964, que nasceu de ideias velhas e que morreria decrépita alguns anos depois.


Chora, a nossa Pátria mãe gentil, diz a letra, a certa altura, na inesquecível voz de Elis Regina, em seu lamento sem desânimo.

40 anos depois – uma vida inteira para muitos de nós – parece que, de novo, a tarde nos desaba como um viaduto, aquele onde passavam, como Carlitos, os nossos sonhos de sermos um país justo, desenvolvido, presente no mundo como podemos ser e, sobretudo, o país de um povo feliz.

Viramos, porém, uma jaula de ódios, nela, vamos rugindo e mostrando as garras – claro, os que as têm – sob o comando de domadores togados, que brandem a ordem do chicote e trancafia em jaulas para que obedeçam às suas vontades e “convicções”.

Nesta nova noite do Brasil, já não se tem irreverências mil, e os homens da muito escura viatura andam para lá e para cá, a procura do suspeito da vez, levando um, outro, mais outro, para que os chupem com os dentes que deixam manchas torturadas e os façam delatar, como paus-de-arara 2.0 que a mídia louva e aplaude.

Vivemos o que na juventude aprendemos a detestar naqueles tempos: as “verdades” que não se contestam, a pretensão da vigilância sobre todos, a mentalidade punitiva, aquela que diz que o castigo e a privação de liberdade são o remédio para uma vida de virtudes, que a lei não é ferramenta de direitos, mas o relho da autoridade, o chicote da punição.

Há os que dizem que isso é a moralidade, há os que dizem que isso é o novo, há os que dizem que isso é o caminho de uma nova ordem, admirável e limpa, embora dela só resulte uma nação em escombros.

O Brasil, a nossa pátria mãe gentil, arruinado e selvagem como, infelizmente, já esteve antes na história deste país.

Mas sei, sabemos todos ou só o sentimos, que uma dor assim pungente não há de ser inutilmente.

E a esperança equilibrista, todo dia tão jovem, tão viçosa, segue na corda bamba, sempre pronta a se esborrachar, com esta turma a balança-la até que caia.

A nossa mãe gentil – a que é a de todos, a que não morre, a que iremos sempre honrar e respeitar, ainda que dela hoje façam gato e sapato – tem que continuar, meu Brasil.



Postado em Tijolaço em 14/05/2017







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