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Manifesto pela anistia de Walter Delgatti e pela prisão de Moro e Dalagnol



Walter Delgatti


Hoje é primeiro de abril, conhecido como o dia da mentira. Escolhemos este dia para lançar este manifesto porque não dá mais para aceitar esta ''Era da pós-verdade", quando a desonestidade e enganação sejam normalizadas na vida contemporânea, e a verdade, a realidade pouco importam.

Embora sempre tenha havido mentirosos, as mentiras geralmente eram contadas com hesitação, uma pitada de ansiedade, um bocado de culpa, um pouco de vergonha, e, pelo menos, alguma timidez.

Agora, assistimos criminosos sem nenhuma vergonha, mentindo descaradamente, enquanto pessoas que nos mostraram a verdade e a realidade estão atrás das grades, impedidas de falar.

No caso de Assange, nem no dia de seu casamento pudemos ver uma foto sequer do estado em que ele se encontra, nas masmorras da rainha.

Snowden teve que se exilar na Rússia para não cair nas mesmas masmorras em que caíram Assange, Chelsea Manning - e Walter Delgatti, aqui em nosso país.

Para restabelecermos a verdade, é urgente que seja concedida a anistia a Walter Delgatti. Ele foi o hacker que denunciou as delinquências da Lava Jato, mudou a história do país, possibilitou as punições ainda brandas que estamos vendo e mostrou quem são Sergio Moro, Deltan Dallagnol e sua turma.

Não fosse Walter, Lula e qualquer outro que ousasse ir contra o projeto criminoso da quadrilha de Curitiba estariam presos, os lavajateiros estariam bilionários e líderes nas pesquisas pra todos os cargos que quisessem, ainda posando de heróis.

É hora de retomar o projeto que o senador Renan Calheiros apresentou para anistiá-lo, é hora do povo brasileiro ter acesso à íntegra da Operação Spoofing - é importante para mostrar como funcionavam as articulações da Lava Jato e da força-tarefa com Moro. E passou da hora de Moro, Dalagnol e seus comparsas do judiciário estarem atrás das grades.

Subscrevem este manifesto os cartunistas da Grafar (Grafistas Associados do Rio Grande do Sul), a AQC - Associação dos Quadrinhistas e Caricaturistas do Estado de São Paulo, a revista Pirralha, o grupo POSTe, revista digital Duas Bandas e Um Conjuntinho, Coletivo Pavio Curto e artistas independentes.














Manifesto pela anistia de Walter Delgatti e pela prisão de Moro e Dalagnol



Walter Delgatti


Hoje é primeiro de abril, conhecido como o dia da mentira. Escolhemos este dia para lançar este manifesto porque não dá mais para aceitar esta ''Era da pós-verdade", quando a desonestidade e enganação sejam normalizadas na vida contemporânea, e a verdade, a realidade pouco importam.

Embora sempre tenha havido mentirosos, as mentiras geralmente eram contadas com hesitação, uma pitada de ansiedade, um bocado de culpa, um pouco de vergonha, e, pelo menos, alguma timidez.

Agora, assistimos criminosos sem nenhuma vergonha, mentindo descaradamente, enquanto pessoas que nos mostraram a verdade e a realidade estão atrás das grades, impedidas de falar.

A morte de Paulo Henrique Amorim não é obra do acaso



morte Paulo Henrique Amorim


Paulo Henrique Amorim era o jornalista mais processado deste período digital. A ampla maioria das ações era movida por criminosos que não aceitavam ouvir o que ele falava. PHA estava sendo perseguido de maneira violenta.

Redação Pragmatismo

Três jornalistas que comentaram a morte de Paulo Henrique Amorim nesta quarta-feira (10) convergem em um ponto: a morte do editor do ‘Conversa Afiada’ não é obra do acaso.


“Combatendo com vigor na escuridão, seu coração não resistiu ao último golpe, o da Record”, escreveu a amiga e renomada jornalista Tereza Cruvinel, referindo-se ao afastamento de PHA de seu programa na TV Record após pressão do governo Bolsonaro.

“Paulo Henrique Amorim parte num momento péssimo. E provavelmente vítima dele e dos canalhas que o perseguiam. Ele foi o jornalista mais processado deste período digital. Na maioria das vezes por criminosos que não aceitavam que aquele baixinho carioca berrasse em alto e bom som o que lhes era merecido ouvir”, publicou Renato Rovai, editor da Revista Fórum e amigo pessoal de Paulo Henrique.


“Eu, aqui do meu canto, acho que Paulo foi ‘morrido’ por essa gente. Porque estava sendo perseguido de maneira violenta e recentemente, por pressão do governo, foi afastado da apresentação do Domingo Espetacular, da TV Record”, acrescentou Rovai.

Morte estudada

Para o jornalista gaúcho Moisés Mendes, a morte de Paulo Henrique Amorim precisa ser objeto de estudo. “Com suas circunstâncias, o contexto político e todos os seus significados, a morte de PHA deveria ser estudada já a partir de hoje à tarde nas escolas de jornalismo. Amorim foi morto pelo assassinato das grandes redações.”

“Hoje, as grandes redações são esvaziadas de qualquer possibilidade de resistência, porque são cada vez mais orientadas para serem cúmplices do poder. Amorim foi apenas um dos mais recentes expulsos do trabalho numa grande corporação […] Seu afastamento da TV Record ganhou manchetes porque ele era uma figura conhecida. Mas as redações passam por limpezas que a maioria não fica sabendo”, complementou Moisés.

O texto integral de Tereza Cruvinel sobre a morte de PHA pode ser lido abaixo. Os textos de Renato Rovai e Moisés Mendes podem ser lidos aqui e aqui.

por Tereza Cruvinel, em seu Facebook

“Obrigado, querida, disso entendemos nós dois: sobreviver”. Foi o que me disse Paulo Henrique Amorim no dia 24, em resposta à minha mensagem expressando solidariedade. Ele acabava de ser afastado do Domingo Espetacular pela TV Record, por pressão do governo intolerante, autocrático e autoritário de Bolsonaro.

Eu havia dito, na mensagem, que ele era um pilar da resistência e vítima do disfarçado e não comentado expurgo de jornalistas que vem acontecendo no país, afastando da mídia os combativos, os que não se vergam. “Eles passarão, nós passarinhos, ainda vamos gorjear”, eu disse ainda ele.

Paulo Henrique entendia mesmo de sobreviver. Eu, nem tanto. Combatendo com vigor na escuridão, seu coração não resistiu ao último golpe, o da Record. Não viveu para um dia gorjear , quando a luz finalmente voltar a iluminar o país com justiça, liberdade e democracia de verdade.

Falando e escrevendo, no estilo cortante que lhe era próprio e único, combateu o engodo, a mentira, a tempestade do ódio, o obscurantismo e o servilismo que tomou conta de boa parte da imprensa. Escandindo as palavras quando falava, ou construindo frases como quem amola a faca, PHA estava o tempo todo na trincheira.

Já fui tirada abruptamente por ato de força, quando o governo Temer interveio na EBC, logo depois do golpe do impeachment. Eu já não era presidente mas comentarista política e apresentadora na TV Brasil. O interventor Laerte Rímoli baniu imediatamente da rede pública uma penca de jornalistas.

Além de mim, Luiz Nassif, Paulo Moreira Leite, Emir Sader, Sidney Resende e outros mais. Havíamos feito uma cobertura intensa e pluralista da guerra contra Dilma, mostrando as duas faces do processo em curso. De repente, ficamos sem chão e sem voz. Imagine o que foi para PHA o golpe da Record, ele que há 14 anos apresentava o Domingo Espetacular.

Depois da covardia da Record, que cedeu à pressão dos que pediam a cabeça de PHA, ele continuou resistindo e combatendo no site Conversa Afiada e na TV Afiada. Ontem à noite ainda o li seu comentário sobre o áudio divulgado por The Intercept, em que o procurador Dallagnol festeja a liminar do ministro Fux impedindo Lula de dar entrevista antes do segundo turno da eleição.

“Hipócrita celebra a decisão de Fux que calou a imprensa “, escreveu ele, chamando agora Dallagnol de Dallainho. Já com data de hoje, outro texto falava da liberação de R$ 2,4 bi em emendas, pelo governo, para juntar votos a favor da reforma da Previdência. Paulo Henrique deve tê-lo escrito de madrugada, antes do infarto. Seu último dardo flamejante.

Caiu um pilar da resistência. Paulo Henrique não sobreviveu fisicamente, mas viverá no exemplo que deixou: como jornalista: não se calou nunca, não se vergou, não se vendeu, não se rendeu, não lambeu botas para preservar posições. Vai, PHA, você fez muito, travou o bom combate e se foi com dignidade.






Abaixo veja o último vídeo gravado por Paulo Henrique Amorim em 08/07/2019












Imagem relacionada



O suicídio do Reitor e a Operação Lava Jato












A morte do reitor e o estado policial



 Luís Nassif






A tragédia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que levou ao suicídio do reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo é ilustrativa desses tempos tormentosos que o país atravessa, com o punitivismo entrando em todas as áreas e abrindo espaço para os tipos mais doentios e desequilibrados.


Os jornais cobriram a tragédia burocraticamente, tratando o volume de recursos fiscalizados – R$ 80 milhões dos cursos de educação à distância – como se fosse a corrupção final. E estabelecendo relações de causa e efeito com o suicídio, não permitindo o direito da dúvida ao reitor, mesmo depois de morto. Afinal, os que recebem a pecha de corrupto não tem direito nem à morte digna.

No entanto, é um episódio exemplar, de como o punitivismo criou uma nova legião, os agentes de controle, os templários da nova ordem, pessoas cuja métrica de avaliação é o rigor sem limites, não distinguindo pequenos delitos de grandes crimes, não entendendo outra forma de punição que não a da destruição total do inimigo.

Os órgãos de fiscalização e de repressão assumiram tal influência que passaram a se imiscuir em vários setores da vida do país, trazendo consigo altas doses de intolerância e de pensamento policialesco e abrindo espaço para personalidades desequilibradas, a verdadeira banalização do mal praticando a crueldade com a segurança de quem tem o Estado atrás de si.

Nos últimos tempos, começou a se disseminar a figura do corregedor da Universidade federal. Ali, plantou-se o ovo da serpente, do poder externo se sobrepondo ao da comunidade.

Em geral, as universidades padecem de problemas sérios de gestão. Muitas vezes pesquisadores competentes são transformados em chefes de departamento, sem nenhuma experiência nem paciência para lidar com problemas administrativos. Criadas para permitir buscar outras fontes de recurso, muitas vezes as fundações não têm a devida transparência na prestação de contas. Por outro lado, há um enorme cipoal burocrático que torna mais difícil ainda a gestão nas universidades e transforma o mero exercício contábil de prestação de contas em um inferno sem fim.

Em vez de aprimoramento nas formas de controle e de induzir as universidades a buscar gestores profissionais, decidiu-se pelo caminho burocrático, de criar uma corregedoria, figura esdrúxula, cujo titular responde administrativamente à reitoria e funcionalmente à CGU (Controladoria Geral da República). Trocaram a gestão pelo espírito policial. Some-se o punitivismo de juízes emulando Sérgios Moros, procuradores imitando a Lava Jato e delegados da PF sendo delegados da PF, e se terá a síntese da tragédia atual e das que ainda estão por ocorrer.

O corregedor policial

A figura central da tragédia da UFSC é o corregedor Rodolfo Hickel do Prado.

Foi Hinckel quem solicitou o afastamento do reitor, que encaminhou as denúncias à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal e, segundo rumores que correm por lá, instruiu uma professora a gravar uma conversa com o reitor.

Figura estranha à Universidade, Hinckel assumiu o cargo no ano passado, indicado pela reitora que saía. Imediatamente tratou de se transformar em um poder autônomo, colocando-se acima da reitoria e das demais instâncias administrativas, um comportamento que refletia, no microcosmo da Universidade, o clima persecutório que tomou conta do país, e o poder apropriado pelos cabeças-de-porta-de-cadeia ganhando um status até então inimaginável.

Alguns conflitos com o Centro Acadêmico do Centro Tecnológico da Universidade deixaram claro esse comportamento de Hinckel.

Houve dois episódios iniciais envolvendo estudantes.

Um, mais grave, foi de uma aluna que falsificou provas. Abriu-se um processo administrativo, que é julgado pelo colegiado do curso. A aluna foi suspensa por oito meses,

O segundo incidente foi uma cola, uma molecagem de um estudante, já reprovado, que copiou parcialmente o trabalho de um colega. O caso também foi apreciado pelo colegiado e o aluno punido com 30 dias de suspensão.

O Centro Acadêmico reagiu, julgando a segunda punição por demais severa e entrou com recurso e o caso foi para o Conselho da Unidade, espécie de 2a instância. Houve um parecer mantendo a punição.

A reação do corregedor foi típica de um perfil psicológico já estudado: se não punir exemplarmente o aluno, hoje é a cola, amanhã estará roubando e traficando.

No dia 16 de outubro, o CA da Produção publicou nota do Facebook onde dizia não concordar com o parecer. Na nota, denúncias de alunas sobre assédio sexual em uma das aulas do departamento.

Quatro dias depois, os alunos receberam ofício do Chefe de Departamento solicitando que fossem apresentados nomes. Os alunos suspeitaram que havia intenção de abafar o escândalo. Como estava em fim de ano letivo, as alunas não queriam deflagrar nada antes de encerrado o período.

Nesse ínterim, continuava em andamento o primeiro caso, da aluna que falsificou as notas. No dia 1o de novembro estava agendada reunião com a aluna e o advogado, para acontecer na sala da professora presidente da Comissão, no Centro Tecnológico.

O local foi alterado a pedido do corregedor.

Terminada a reunião, o corregedor chegou até os alunos do CA e começou a ameaça-los explicitamente. Dizia que estavam espalhando calúnias contra os professores. Exigia nomes. Os alunos explicaram que as colegas estavam esperando terminar o semestre para avançar com as denúncias.

Na 6a feira, a presidente do CA recebeu SMS intimando-a a se apresentar na corregedoria. Presentes na sala, apenas ela e o corregedor. Foi pressionada de todos os modos para entregar nomes. A moça permaneceu firme na postura de só entregar após encerramento do ano letivo.

Na semana seguinte, começou o terremoto. Mais de 100 alunas passaram a receber intimações, no meio das aulas, para que se apresentassem na corregedoria. Algumas das intimações interromperam aulas com provas de cálculo, o terror dos politécnicos.

O critério adotado pelo corregedor foram os cliques na nota do Facebook. Todas as alunas que “curtiram” a nota foram intimadas e submetidas a métodos policialescos. Para uma das primeiras convocadas, Hinckel informou haver denúncia de cola em sala de aula. A ameaça desestabilizou-a por inteiro. Ai o corregedor explicou que era brincadeira.

No total, foram intimados mais de 200 alunos, obrigando o CA a contratar um advogado para entrar na história. Criou-se um clima de terror amplo, com o entorno dos alunos entrando em pânico com as amaças.

O advogado abriu denúncia no Comitê de Ética da Universidade, para fugir do cerco do corregedor. Era nítido para os alunos que sua intenção era abafar o caso e transformar os alunos em réus. No auge do terror, os alunos procuraram o reitor Cancellier. O reitor recebeu-os prontamente, ligou para o corregedor, que foi até à sala.

- Olha, Rodolfo, você não tem poder coercitivo. Se alguém não atender a essa chamada, você não terá nada a fazer.

O corregedor sentiu-se desautorizado. Depois, circularam pela Universidades queixas de diversas pessoas sobre os problemas criados recorrentemente pelo corregedor, que atropelava procedimentos e não seguia os ritos da Universidade.

Certa vez, por conta própria Hickel chegou a afastar um professor de suas atividades. O chefe de gabinete da reitoria precisou retificar a medida, que havia sido publicada no Diário Oficial.

Essa sucessão de episódios ampliou o fosso entre o corregedor e a reitoria.

Pouco depois, foi apresentada a denúncia ao MPF e à Polícia Federal. Ali, começava a ser montada a tragédia.

A delegada Erika Marena, personagem do filme sobre a Lava Jato, fez o pedido de prisão preventiva e, no momento em que ocorreu, toda a imprensa de Florianópolis já estava a postos. Como sempre ocorre nesses casos, o MPF foi a reboque. Sem acesso aos autos, o procurador da República André Bertuol endossou burocraticamente o pedido. E a juíza Janaína Cassol Machado aquiesceu com a gana de carnívoros famintos.

Como não havia celas na PF, os prisioneiros foram submetidos a um amplo ritual de humilhação. Despidos, colocados em uniformes de presidiários, algemados e transportados para o presídio estadual. Até hoje, em Florianópolis, apenas dois tipos de personagem tiveram tratamento similar: traficantes e um empresário que respondia a mais de 60 processos. O empresário conseguiu responder aos processos em liberdade.

Em todo caso, a delegada Erika, o procurador Bertuol, a juíza Janaína, o próprio corregedor Rodolfo são personagens menores. O grande personagem é o espírito punitivista desses tempos de cólera, e uma imprensa sensacionalista, totalmente dissociada de princípios civilizatórios básicos, que acabou conferindo a mentes perturbadas o poder inaudito de assassinar reputações.

A morte física do reitor foi apenas um acidente de percurso. E os protagonistas, não mais que de repente, perderam a atração pelos holofotes.


Postado em Portal Luis Nassif em 03/10/2017







Ex-senador Nelson Wedekin: "Pior do que a desonra é a dor de quem não a merece"



Um dos discursos mais aplaudidos, muitas vezes de pé, pela comunidade universitária, familiares e amigos do reitor Luiz Carlos Cancellier, durante a solenidade fúnebre do Conselho Universitário da UFSC, foi proferido pelo ex-senador e advogado Nelson Wedekin.

Começou falando das "mãos visíveis e invisíveis que empurraram o reitor das alturas para a morte", destacou suas virtudes humanas e qualidades pessoais, acadêmicas e políticas e posicionou-se de forma crítica contra as arbitrariedades de sua prisão violenta e injusta.

Veja a íntegra do pronunciamento. Merece profunda reflexão de todos, especialmente, dos responsáveis diretos por esta dolorosa tragédia:

" Luiz Carlos Cancellier de Olivo, o Cao, está morto.
Nas estatísticas oficiais a morte de Cao será contada como suicídio.
Mas ninguém se iluda. Mãos visíveis algumas, que podem ser identificadas sem que seja necessário levar ninguém à prisão, e mãos invisíveis, muitas mãos invisíveis, o empurraram das alturas, de modo que os seus ossos se quebrassem, o sangue jorrasse na hemorragia incontrolável, e a vida se extinguisse rapidamente no choque terrível. Instantes depois do baque surdo, o coração cheio de bondade, de tolerância, de respeito ao próximo, parou de bater.
Que mãos eram essas? Mãos de quem talvez saiba o que é vingança, mas sabe pouco do que seja justiça. Mãos de quem só têm a si mesmo como honestos e virtuosos, senhores do bem e do mal, da reputação de quem mal conhecem e que não têm curiosidade de conhecer. Mãos de quem, tendo o poder de prender, ignoram a gravidade do delito suposto, e para quem tanto faz ter o cidadão ficha limpa ou antecedentes criminais. Mãos de quem, sendo ciosos da imagem de suas respectivas instituições, desprezam, entretanto, a imagem das demais, como deuses de um alcorão, uma bíblia fundamentalista.
Mãos de quem, tendo o poder de prender sem flagrante, e de começar uma investigação pela coerção, constrangimento e prisão dos suspeitos, não chegam a perceber que o método rústico revela a incapacidade de cumprir seus deveres e obrigações com inteligência, método e moderação.
Mãos de quem, ciosos de seu poder e autoridade, ao invés de exercê-los com critério, partindo do pressuposto inalienável de que o cidadão pode ser culpado, pode ter só parte de culpa, ou nenhuma culpa, pensando que seu juízo e sua intuição são infalíveis, só têm olhos para as evidências que confirmem as suas suspeitas.
Mãos de quem, ainda ontem frequentavam os bancos da faculdade, mas para quem a presunção da inocência - pináculo do estado de Direito, pilar da democracia, conquista da civilização - é um inútil ornamento da lei.
Mãos de quem não abrigam em seus corações nenhum sinal de bondade, de compreensão pelo outro, e em suas cabeças nenhum raciocínio a respeito da proporção dos seus atos, nenhuma projeção dos seus efeitos e suas consequências, para o ser humano, a instituição, a comunidade.
Mãos de quem em nada parecem saber que a prisão é, em toda circunstância, a não ser nas ditaduras, desonrosa. Em nada parecem saber que abate, constrange e humilha, aprisionar, examinar alguém em corpo nu, vesti-lo em roupa de prisioneiro, e que tudo isso adentra pelo terreno da barbárie, ainda mais quando se faz sem flagrante, sem a sentença, antes mesmo de ser réu.
Mãos de quem se aproveitam de uma época inglória e insana, de uma sociedade exaurida pelos escândalos públicos, e que em boa parte, têm espuma e sangue nos lábios, e para quem tudo é joio, e trigo só eles são, tendo na ponta da língua os chavões da época, de condenação geral aos bandidos de verdade, mas levando juntos os que passaram perto e os inocentes que têm o azar de atravessar o caminho.
Um pouco de humildade, um pouco de humanidade não lhes faria mal. Não conheço nenhum desses agentes da lei, e não desejo conhecê-los, porque tenho medo deles. Que autoridades são essas que ao invés de proteger nos causam medo e terror? Quem são eles, assim destituídos de humanidade e razão? É preciso agir com a mão assim pesada, com tal crueldade, com tal virulência e desumanidade?
Não se passa o país a limpo assim, senhores e senhoras. Digo de novo o que já escrevi: os senhores, as senhoras, estão jogando o bebê fora junto com a água do banho.
Mãos não só de autoridades, mas de uma imprensa que primeiro atira e só depois pergunta quem vem lá, quando e se pergunta. Uma imprensa que toma como verdadeira, em princípio, a palavra da autoridade, não mediada, não contextualiza. De blogueiros, ativistas e pessoas "comuns" que, raivosos, expelem argumentos chulos, pensamentos prontos, clichês preconceituosos, manifestações de atraso, ignorância, e ódio, muito ódio nas redes sociais Mãos de quem confunde moral com moralismo de baixo custo, que a todos rotula, por método, costume e um certo prazer sádico.
Cancellier almoçou lá em casa há menos de uma semana. Com o filho Mikhail, Ricardo Baratieri, Arlete e Nara Micaela. Ao final, nós estávamos reconfortados. Cancellier nos pareceu lúcido, fazendo um esforço genuíno para compreender que tinha sido vítima de uma dessas armadilhas do destino, uma coincidência infeliz. Ele parecia razoavelmente recuperado do golpe sofrido.
Um turbilhão que tudo arrasta, um vendaval que se solta, uma cilada da vida: assim pareceu Cancellier encarar o seu drama pessoal. Ele aparentava uma calma estranha, uma misteriosa resignação. Quando soube de sua morte ontem, compreendi imediatamente: ele já havia engendrado o seu destino, fingiu serenidade, para que ninguém quisesse interromper o plano que já tinha traçado. Alguém já disse que não há pior vergonha do que a de não ter feito o que lhe imputam. Muito pior que a desonra, é o sentimento de quem não a merece.
Podem ficar tranquilos todos e cada um dos mais de cem agentes públicos e autoridades do Estado que, de alguma forma contribuíram para desenlace trágico, dando ou cumprindo ordens, assinando as portarias, os despachos, cumprindo as frias formalidades da "lei", que este homem singular, Cancellier, que não cultivou em vida a raiva, a mágoa, o ressentimento, também não os levará para a eternidade.
Conduziram ao camburão, abriram as portas do cárcere um homem que não queria mal a ninguém, que não fazia mal a ninguém. Um homem de coração generoso e aberto, um democrata na teoria e mais ainda na prática, um homem de diálogo e conciliação, um campeão da harmonia e da paz. Ah, Cancellier, como você, querido amigo e querido irmão fará falta, ainda mais nesta terra brasileira nunca tão dilacerada pela dissensão e a intolerância, apequenada nos conflitos políticos de uma República abastardada, no facilitário do ódio, na insensatez arrogante de muitas das suas elites.
Como fará falta sua voz calma e pacificadora, em busca da palavra certa em favor do diálogo e do entendimento, na instituição que você respeitou, protegeu e amou mais do que qualquer outro, a quem você emprestou o seu talento e capacidade de trabalho, esta Universidade Federal de Santa Catarina, o palco involuntário de uma tragédia que marcará para sempre e indelevelmente a sua história.
Abraço caloroso, Mikhail, Júlio, Acioly, Cristiane, familiares, amigos. Choremos o passamento de Cao Cancellier e sigamos o seu exemplo, de uma vida dedicada ao bem, à justiça, à liberdade e à paz entre os homens. Descanse Cao em algum lugar, na dimensão possível. E rezemos para que esta tragédia que nos causa tamanho torpor, tal comoção, que nos fere tão fundo na alma, de alguma maneira seja uma lição que nos afaste da barbárie, nos contagie com um pouco de fraterna humanidade, nos dê força para enfrentar esta provação.
Abraço sentido e caloroso, reitora Alacoque, pró-reitores, diretores, servidores e alunos. Universidade, se bem interpreto o pensamento do amigo e irmão que se foi de forma tão despropositada, é lugar onde se privilegia o conhecimento e o saber, a extensão e pesquisa. É o lugar dos crentes e dos ateus, dos socialistas e dos liberais, da direita e da esquerda, dos negros, indígenas e brancos, dos pobres e dos ricos, das mulheres e dos homens, dos héteros e dos homossexuais. Aqui se encontram, convivem e aprendem para a vida e a cidadania, todas as tribos da comunidade nacional e planetária.
Todos os que se acham superiores moralmente, politicamente, esqueçam. Somos todos iguais ou parecidos em defeitos e qualidades. Experimentem, como o Cao fazia o tempo todo, calçar de vez em quando as sandálias da humildade. A Universidade não é o lugar apropriado para a guerrilha política, para o "nós" contra "eles". Aqui podem e até devem se bater as facções, as narrativas históricas, mas ninguém é dono do futuro e só uma busca é possível e legítima: a de uma sociedade próspera, justa, livre e fraterna. Universidade rima com verdade e liberdade.
Nelson Wedekin "


Postado em Conversa Afiada em 04/10/2017








" A Globo nasceu de uma ilegalidade " : Livro O Quarto Poder conta detalhes do surgimento da Rede Globo e de como o governo do ditador Artur da Costa e Silva (1967-1969) salvou a emissora







O jornalista Paulo Henrique Amorim está lançando o livro O Quarto Poder - uma outra história. 


Nele, o apresentador e blogueiro mescla sua trajetória profissional com a história de poder da imprensa brasileira em momentos históricos.

"No Brasil, em muitas circunstâncias, a imprensa é o primeiro poder. A força dela aqui é superior à força que a gente encontra em outras democracias no mundo", afirmou Amorim que chama a reunião dos grandes grupos midiáticos brasileiros de Partido da Imprensa Golpista (PIG).

O nome do criador da Rede Globo, Roberto Marinho é bastante presente no livro. Amorim conta que, diferentemente das publicações antigas sobre Marinho “de bajulação rasteira e vulgar” seu livro mostra bastidores e trata o empresário “com as armas que ele deveria ser tratado”.

Em uma das passagens, Amorim conta qual foi a ordem de Marinho para a equipe de redação da emissora no episódio do debate entre os então presidenciáveis Collor e Lula, no segundo turno em 1989:
 “o que for de melhor do Collor com o que for de pior do Lula”.

O livro também conta detalhes do surgimento da Rede Globo e de como o governo do ditador Artur da Costa e Silva (1967-1969) salvou a emissora, fazendo as estatais comprarem maciças cotas de publicidade.
“A Rede Globo nasceu de uma ilegalidade, financiada por um grupo americano, o Time-Life, o que era proibido pela Constituição. O Roberto Marinho deu uma garantia das posses pessoais dele, sabendo que a Globo receberia uma publicidade a preço de tabela. A Globo vendeu esses espaços para as estatais e pôde comprar a parte do Time-Life e saiu no lucro”, denuncia.

O lançamento do livro é na próxima quinta-feira (3), às 19:30, na Livraria Saraiva do Shopping Higienópolis, em São Paulo (SP).


Postado no Carta Maior em 28/08/2015












Porque decidi processar Gilmar Mendes



Luis Nassif


O Ministro Gilmar Mendes me processou, um daqueles processos montados apenas para roubar tempo e recursos do denunciado. Eu poderia ter ficado na resposta bem elaborada do meu competente advogado Percival Maricatto.

Mas resolvi ir além.

Recorri ao que em Direito se chama de "reconvenção", o direito de processar quem me processa.

A razão foram ofensas graves feitas por ele na sessão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na qual não conseguiu levar adiante a tentativa canhestra de golpe paraguaio, através da rejeição das contas de campanha de Dilma Rousseff.

Todo o percurso anterior foi na direção da rejeição, inclusive os pareceres absurdos dos técnicos do TSE tratando como falta grave até a inclusão de trituradores de papel na categoria de bens não duráveis.

Não conseguiu atingir seu propósito graças ao recuo do Ministro Luiz Fux, que não aceitou avalizar sua manobra. Ele despejou sua ira impotente sobre mim, valendo-se de um espaço público nobre: a tribuna do TSE.

“Certamente quem lucrou foram os blogs sujos, que ficaram prestando um tamanho desserviço. Há um caso que foi demitido da Folha de S. Paulo, em um caso conhecido porque era esperto demais, que criou uma coluna 'dinheiro vivo', certamente movida a dinheiro (...) Profissional da chantagem, da locupletação financiado por dinheiro público, meu, seu e nosso! Precisa ser contado isso para que se envergonhe. Um blog criado para atacar adversários e inimigos políticos! Mereceria do Ministério Público uma ação de improbidade, não solidariedade”.

O que mereceria uma ação de improbidade é o fato de um Ministro do STF ser dono de um Instituto que é patrocinado por empresas com interesses amplos no STF em ações que estão sujeitas a serem julgadas por ele. Dentre elas, a Ambev, Light, Febraban, Bunge, Cetip, empresas e entidades com interesses no STF.

Não foi o primeiro ato condenável na carreira de Gilmar. Seu facciosismo, a maneira como participou de alguns dos mais deploráveis factoides jornalísticos, a sem-cerimônia com que senta em processos, deveriam ser motivo de vergonha para todos os que apostam na construção de um Brasil moderno.

Gilmar é uma ofensa à noção de país civilizado, tanto quanto Eduardo Cunha na presidência da Câmara Federal.

A intenção do processo foi responder às suas ofensas. Mais que isso: colocar à prova a crença de que não existem mais intocáveis no país. É um cidadão acreditando na independência de um poder, apostando ser possível a um juiz de primeira instância em plena capital federal não se curvar à influência de um Ministro do STF vingativo e sem limites.

Na resposta, Gilmar nega ter se referido a mim. Recua de forma pusilânime.

“o Reconvindo sequer faz referência ao nome do Reconvinte, sendo certo que as declarações foram direcionadas contra informações difamatórias usualmente disseminadas por setores da mídia, dentro dos quais o Reconvinte espontaneamente se inclui”.

Como se houvesse outro blog de um jornalista que trabalhou na Folha, tem uma empresa de nome Agência Dinheiro Vivo e denunciou o golpe paraguaio que pretendeu aplicar na democracia brasileira.

A avaliação do dano não depende apenas da dimensão da vítima, mas também do agressor.

E quando o agressor é um Ministro do Supremo Tribunal Federal, que pratica a agressão em uma tribuna pública - o Tribunal Superior Eleitoral - em uma cerimônia transmitida para todo o país por emissoras de televisão, na verdade, ele deveria ser alvo de um processo maior, do servidor que utiliza a esfera pública para benefício pessoal.


Postado no Contraponto em 28/08/2015