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Marcha pela “ paz ”, alma de Herodes


herodes

Fernando Brito

A imagem do vídeo publicada pelo portal Terra com a faixa carregada por um menino e duas meninas, ontem, no bairro de classe média-alta do Jardim Marajoara, em São Paulo é o retrato dos tempos que estamos vivendo.

Já nem é uma discussão, que deveria ser anacrônica no mundo moderno – excetuados, claro, os fanáticos do Exército Islâmico – sobre a legitimidade ou a eficácia da pena de morte (que, em tese, deveria ter feito dos EUA um dos países menos violentos no mundo), mas a sua aplicação, como sugere a faixa, até mesmo a crianças de qualquer idade.

Algo assim semelhante a Herodes.

São três guris que levam a faixa – como na idade deles eu levei pedindo democracia e respeito à dignidade humana – da morte sem idade para ter visto a vida, sequer e dar-lhe o valor que, velhos, nos faz querer conservá-la até o último suspiro.

Era uma marcha pela “paz”.

Paz, como a “pax romana” dos tempos daquele Herodes, feita com armas e autoritarismo.

E com a arma suprema destes tempos, avassaladora: a mídia.

Pena de morte, sem limite de idade, a crianças, até.

A esta turma, um pobre ateu feito eu, recomendo a leitura de Mateus 5:20-22:

Pois eu lhes digo que se a justiça de vocês não for muito superior à dos fariseus e mestres da lei, de modo nenhum entrarão no Reino dos céus.
Vocês ouviram o que foi dito aos seus antepassados: ‘Não matarás’, e ‘quem matar estará sujeito a julgamento’.
Mas eu lhes digo que qualquer que se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento.
Também, qualquer que disser a seu irmão: ‘Racá’ (significa desprezível) , será levado ao tribunal. E qualquer que disser: ‘Louco!’, corre o risco de ir para o fogo do inferno.


Postado no Tijolaço em 01/06/2015


Pena de morte, a barbárie estatal



Juremir Machado da Silva


A Indonésia executou um brasileiro por tráfico de drogas. Outros homens também foram fuzilados. A pena de morte é um resquício da barbárie em pretensas civilizações.

É a lei de Talião.

Matar um homem imobilizado é o supremo ato de covardia. Bandidos fazem isso. O Estado não pode fazê-lo.

Ainda mais para punir um crime sem sangue. Não foi assassinato. Não foi latrocínio. Não foi estupro.

A mesma Indonésia não condena à morte terroristas.

Interessante é que liberais, defensores da não intervenção estatal em economia, costumam defender o máximo de intervenção estatal em comportamento. Se um adulto quer se drogar ou se matar, o que Estado tem a ver com isso? Deveria o Estado fazer campanhas educativas. Mais do que isso é intervir na esfera privada.

Os liberais em economia adoram um ditadura política e comportamental. Liberais brasileiros tiveram no ditador Pinochet um ídolo. Liberais brasileiros bancaram nossa ditadura de 1964 a 1989. São liberais em economia que buscam na intervenção estatal máxima a realização dos seus delírios de não intervenção do Estado em economia.

Em bom português, aproveitadores que adoram subsídios estatais, sonegação de impostos e tetas.

A única lei que reconhecem é: tudo é bom para ganhar mais dinheiro.

O Estado deles deve existir para forçar a mão de obra a se reproduzir e aceitar as regras do jogo.

Todo consumo de drogas que provocam dependência é lamentável. A proibição, porém, não resolve. Gera tráfico, violência e corrupção. É guerra perdida porque adultos querem consumir e não se pode prender metade da população de um país. 

Os liberais em economia, defensores até da pena de morte para traficantes de drogas, não pedem a proibição do álcool, a droga que mais mata, nem do cigarro, a droga que mata lentamente sem provocar alucinações e outros baratos ou caros que modificam a percepção dos consumidores. Aí pode.

O cigarro é a pior das drogas. Mata sem fazer alarde e ainda afeta quem estiver por perto e nem for fumante.

Um liberal coerente deve pedir a liberação de todas as drogas. Ou, se tiver argumentos, a proibição de todas.

Fico pensando, por outro lado, nos carrascos, os seres humanos que aceitam executar um homem a mando do Estado. Que pessoas repugnantes! Que destinos infelizes! O que pode levar alguém a aceitar esse ofício?

Quase tão triste quanto isso é o aplauso de “pessoas de bem” a uma execução com base nas falácias do
“que serva de exemplo”, “lei é lei” ou “ele sabia que lá tráfico da pena de morte”. Muitas dessas pessoas são as mesmas que cometem infrações de trânsito e não querem pagar a multa. Nesse caso, lei não é lei.

O argumento do livre arbítrio – ele escolheu seu destino – favorece a tese da liberação das drogas: adultos devem poder decidir o que querem fazer com seus corpos sem que o Estado lhes imponha limites.

O Estado deve existir para me proteger de outros, não de mim mesmo e de minhas decisões.

Cabe ao Estado, como faz com o álcool, proteger menores.

Qual a diferença entre álcool e cocaína? Ambos matam, destroem famílias, comprometem destinos. O álcool, por ser liberado, não carrega as mortes do tráfico e da corrupção. Bastam-lhe as do trânsito e das brigas de bar.

O cigarro é o assassino silencioso. Paga impostos, gera empregos. Pode. É fato consumado.

Em qualquer situação, o Estado matar um homem imobilizado é a negação da civilização.

Os aplausos revelam o pior da humanidade em cada um: ressentimento, gosto de sangue e simplismo.


Juremir Machado da Silva é escritor gaúcho, jornalista e professor universitário.


Postado no Blog Juremir Machado da Silva em 18/01/2015



Não matarás ! Uma lembrança de Dostoievsky sobre a pena de morte




Marco Aurélio Weissheimer

O brasileiro Marco Acher foi executado, por fuzilamento, sábado, na Indonésia. Ele foi condenado à morte por tráfico de drogas. Há outro brasileiro, Rodrigo Goularte, que também está no corredor da morte na Indonésia, pelo mesmo crime. Arrisquei mencionar o ocorrido para um taxista aqui em Porto Alegre na tarde deste sábado. Já imaginava qual seria a reação e minha expectativa não foi frustrada. 

O taxista defendeu a execução, a introdução da pena de morte no Brasil e sua aplicação a milhares de “bandidos e políticos”. “Vai ter uma fila quilométrica para as execuções”, emendou. Essa seria, para ele, a imagem de um Brasil decente: um país com filas de condenados aguardando para serem executados. Além disso, criticou a presidente Dilma Rousseff por ter pedido clemência ao presidente da Indonésia. Fiquei calado, ouvindo e pensando como é doloroso e difícil enfrentar esse debate.

Em um ensaio sobre a pena de morte, Norberto Bobbio faz uma retrospectiva histórica sobre o debate em torno da pena de morte, elencando argumentos favoráveis e contrários à prática. Não se trata de uma mera lista. Bobbio tem posição a respeito, que fica explicitada logo no título do ensaio, “Contra a pena de morte” (publicado no Brasil no livro “A Era dos Direitos”, Editora Campus). 

Logo no início ele adverte que o debate sobre a abolição da pena de morte, de uma perspectiva histórica, mal começou.
“Durante séculos, o problema de se era ou não lícito (ou justo) condenar um culpado à morte sequer foi colocado. Jamais se pôs em dúvida que, entre as penas a infligir a quem violou as leis da tribo, ou da cidade, ou do povo, ou do Estado, estivesse também a pena de morte (…)”, escreve Bobbio.
Será apenas no século XVIII que encontraremos pela primeira vez um debate aprofundado sobre a licitude ou conveniência da pena de morte, com a obra de Beccaria, “Dos Delitos e das Penas” (1764). “Trata-se da primeira obra”, assinala Bobbio, “que enfrenta seriamente o problema e oferece alguns argumentos racionais para dar-lhe uma solução que contrasta com uma tradição secular”. O debate sobre a pena de morte e, em particular, contra a pena de morte, tem, portanto, cerca de 250 anos de vida, um período muito pequeno diante de uma história de milhares de anos de mortes, crimes, punições e execuções.

Em seu ensaio, Bobbio resume algumas das principais teses utilitaristas, retributivistas e abolicionistas, a favor e contra a pena de morte. Para quem quiser conhece-las, o link para a íntegra do artigo está disponível no início desse texto. 

Como defensor da extinção da pena de morte, gostaria apenas de destacar a passagem final do artigo de Bobbio onde ele lembra uma passagem de Dostoievski e aponta o que considera ser o postulado ético central que embasa a posição contra a pena de morte. Ele identifica esse princípio a partir de uma limitação da tese utilitarista contra a pena de morte: “o limite da tese está numa pura e simples presunção, a de que a pena de morte não serve para fazer diminuir os crimes de sangue. Mas se se conseguisse demonstrar que ela previne tais crimes?” – indaga.

Neste caso, observa, teríamos de recorrer a outra instância de caráter moral, a um princípio posto como absolutamente indiscutível. E esse argumento, defende, só pode ser derivado do imperativo moral “não matarás”, que deve ser acolhido como um princípio de valor absoluto. 

Bobbio antecipa uma objeção a essa posição: 
“Mas como? Poder-se-ia retrucar: o indivíduo tem o direito de matar em legítima defesa, enquanto a coletividade não o tem?”
Não, a coletividade não tem esse direito, responde Bobbio:
“A coletividade não tem esse direito porque a legítima defesa nasce e se justifica somente como resposta imediata numa situação na qual seja impossível agir de outro modo; a resposta da coletividade é mediada através de um processo, por vezes até mesmo longo, no qual se conflitam argumentos pró e contra. Em outras palavras, a condenação à morte depois de um processo não é mais um homicídio em legítima defesa, mas um homicídio legal, legalizado, perpetrado a sangue frio, premeditado. Um homicídio que requer executores, ou seja, pessoas autorizadas a matar. Não é por acaso que o executor da pena de morte, embora autorizado a matar, tenha sido sempre considerado como um personagem infame (…)”.
E acrescenta:
“O Estado não pode colocar-se no mesmo plano do indivíduo singular. O indivíduo age por raiva, por paixão, por interesse, em defesa própria. O Estado responde de modo mediato, reflexivo, racional. Também ele tem o dever de se defender. Mas é muito mais forte do que o indivíduo singular e, por isso, não tem necessidade de tirar a vida desse indivíduo para se defender. O Estado tem o privilégio e o benefício do monopólio da força. Deve sentir toda a responsabilidade desse privilégio e desse beneficio”.
Bobbio admite que esse raciocínio pode ser tachado de “moralismo ingênuo, de pregação inútil.” Mas onde reside, então, a razão da nossa repugnância frente à pena de morte? – questiona. Ele responde:
“A razão é uma só: o mandamento de não matar. Não vejo outra. Fora dessa razão última, todos os demais argumentos valem pouco ou nada; podem ser contraditos por argumentos que têm, mais ou menos, a mesma força persuasória. Dostoiévski o disse magnificamente, quando pôs na boca do Príncipe Michkin as seguintes palavras: “Foi dito: ‘Não matarás.’ E, então, se alguém matou, por que se tem de matá-lo também? Matar quem matou é um castigo incomparavelmente maior do que o próprio crime. O assassinato legal é incomparavelmente mais horrendo do que o assassinato criminoso.”
Na mesma direção, Bobbio cita duas passagens do escritor francês Victor Hugo (outro defensor da extinção da pena capital), em “Os Miseráveis”:
“O patíbulo, quando está lá, erguido para o céu, tem algo de alucinante. Alguém pode ser indiferente quanto à pena de morte e não se pronunciar, não dizer nem sim nem não; mas isso só enquanto não viu uma guilhotina. Quando vê uma, o abalo é violento: ele é obrigado a tomar partido a favor ou contra.”
A segunda passagem narra uma experiência de Victor Hugo, quando tinha dezesseis anos e viu uma ladra que um carrasco marcava com ferro em brasa:
“Ainda conservo no ouvido, quarenta anos depois, e sempre conservarei na alma, o espantoso grito da mulher. Era uma ladra; mas, a partir daquele momento, tornou-se para mim uma mártir.”
A distância que existe entre essas palavras e o desejo de filas de execuções manifestado pelo taxista dá bem uma ideia da distância que ainda precisa ser percorrida para que o “Não matarás!” deixe de ser um princípio contra intuitivo e estranho à nossa vida cotidiana.


Postado no blog RSUrgente em 18/01/2015


Ideologia das trevas virou moda




Bepe Damasco, em seu blog

Tomando por base o que lemos na internet e ouvimos na filas do banco, nos supermercados, ônibus, metrôs, trens, nos restaurantes e nos botecos, cada vez mais brasileiros perderam o pudor de defender as teses mais obscurantistas, xenófobas, racistas e preconceituosas, na direção oposta de várias conquistas humanistas e civilizatórias. 

Por isso, o apoio maciço à bárbara execução do brasileiro Marco Archer pela Indonésia, nas redes sociais, não surpreende. É apenas mais uma entre as incontáveis manifestações insanas que inundam os comentários dos sites noticiosos do PIG, o facebook e o twitter. Ser reacionário e fascista está virando moda no Brasil, essa é a verdade. 

Aos cientistas políticos, antropólogos, psicólogos e quadros políticos deixo uma sugestão para análise e estudo: por que será que o ódio e a intolerância como instrumentos de luta política cresceram de forma tão exponencial depois das jornadas de junho de 2013 ?

Já virou rotina ler descerebrados pregando na internet barbaridades como o assassinato de Lula, Dilma e de todos os petistas. O ódio a nordestinos, elevado à enésima potência depois que o Nordeste passou a votar em peso nos candidatos a presidente do PT, também faz sucesso entre muitos moradores dos bairros chiques dos grandes capitais do Sudeste e do Sul.

Chegam a propor a céu aberto a cassação do direito a voto dos beneficiários do bolsa família e, óbvio, são contra a política de cotas raciais e sociais para ingresso nas universidades e no serviço público, torcem o nariz para a valorização do salário mínimo e esbravejam quando o assunto é a lei que estende direitos trabalhistas para as empregadas domésticas. 
 
Um traço marcante entre os adeptos desta ideologia das trevas é a extrema superficialidade e a pobreza de argumentos de suas opiniões, fruto de um analfabetismo político crônico e incurável. 

Para eles, foi o PT que inventou a corrupção no Brasil e as notícias de Veja e do Jornal Nacional são verdades absolutas. No cipoal de bobagens que vivem a trombetear e multiplicar, destacam-se a compra da Friboi pelo filho de Lula e o enriquecimento da filha da presidenta Dilma. 

Dispensa comentários a influência do monopólio midiático na formação do conjunto de valores desses brasileiros imbecilizados.

"Especialistas" em política externa, condenam o alinhamento do Brasil a "ditaduras" como Venezuela, Bolívia e Equador. Nem de longe lhes ocorre que em todos esses países os governantes são eleitos em pleitos livres e democráticos. Mas o que importa é alardear que o PT quer implantar um regime "bolivariano" no Brasil. Aposto que uma pesquisa feita no universo reaça brasileiro mostraria que mais de 90% dos consultados desconhecem quem foi Simon Bolívar, o grande libertador da América espanhola.

Por tudo isso, seria lhes pedir demais que levassem em consideração algumas informações, dados e constatações importantes sobre a questão da pena de morte e do tráfico de drogas no mundo. 

Mais de dois terços dos países não têm a pena de morte nas suas legislações penais. Noutros, embora suas leis prevejam essa punição, ela foi abolida na prática. Mesmo nos EUA, país conhecido por adotar a pena capital, a grande maioria dos estados já não a pratica. O Texas é responsável por mais da metade das execuções ocorridas nos EUA.

Sobre a repressão ao tráfico de drogas, é sabido que o mundo só tem acumulado derrotas nesta guerra. A política mundial de repressão, comandada pelos EUA, se revelou através dos anos um retumbante fracasso, seja em relação ao objetivo de desmantelar as quadrilhas de narcotraficantes ou à tentativa de desestimular as pessoas ao consumo. Centenas de milhares de vidas foram perdidas e uma soma incalculável de recursos públicos foram consumidas nessa guerra.

Hoje, há o reconhecimento crescente de que algum nível de liberalização e descriminalização terá de ser adotado em escala mundial, a exemplo do que já fazem vários países europeus e, mais recentemente, o Uruguai, do bravo estadista Mujica. 

Também é uma questão de tempo a mudança na abordagem central da questão das drogas, substituindo o foco exclusivo na repressão pela ênfase na saúde pública.

Para os "justiceiros" das redes sociais, a Indonésia fez muito bem em fuzilar um traficante. Simples assim. 

Não importa a grande desproporcionalidade entre o crime cometido e os castigo imposto. Não importa que Marco Archer tenha cumprido 11 anos de cadeia na Indonésia. Não importa que ele tenha reconhecido seu erro e pedido clemência. 

Infelizmente, se alastra como rastilho de pólvora em nosso país uma ideologia que despe o ser humano de noções básicas de solidariedade, justiça e compaixão. Uma tristeza.



Postado no Blog do Miro em 19/01/2015